Na sombra de um pré-presidente preso
Uma tempestade avoluma-se no horizonte do regime estado-unidense. O primeiro debate entre os pré-candidatos republicanos, na semana passada, foi um barómetro eficaz da desagregação política e social que dilacera o império.
Entre os oito candidatos e os respectivos grandes grupos económicos não houve consenso sobre a melhor panaceia para o declínio da hegemonia dos EUA no mundo: DeSantis, governador da Florida, apelou à guerra contra o México; Pence apelou à guerra contra a Rússia; Ramaswamy apelou à guerra contra a China. Já o elefante na sala, o omnipresente Trump, não saberemos tão cedo porque nem sequer participou, para com o seu silêncio franzido de uma qualquer esquadra da polícia da Geórgia, dizer aos EUA que está muito acima da política, dos argumentos, dos debates, das primárias, do circo mediático — e até das leis.
A confusa desarticulação entre os pré-candidatos republicanos contribuiu para cimentar a posição de Trump como a cunha que pode fazer rachar o velho bipartidarismo. Chris Christie quis partir a espinha aos sindicatos, Ramaswamy apelou à construção de «uma maioria de classe trabalhadora multiétnica» e Nikki Haley saudou os professores em greve. Já Trump, que não disse nada a não ser que a perseguição de que é alvo é uma «caça às bruxas», continua a liderar a corrida republicana em todas as sondagens, com uma vantagem de mais de 40 por cento sobre todos os rivais.
A implosão da legitimidade das grandes instituições do capitalismo estado-unidense, neste caso do Partido Republicano, que se vão tornando mais voláteis e bizarras à medida que a crise histórica do imperialismo se aprofunda, reflecte a crescente incapacidade de dar resposta aos problemas da sociedade. Sobre educação, por exemplo, pré-candidatos houve a prometer mais centralismo federal e mais autonomia dos Estados; mais financiamento público e mais privatizações; menos carga doutrinária nos programas e mais valores conservadores. Para lá da gritaria, ao não propor absolutamente nada, Trump pode ser mais apelativo do que oito candidatos que propõem absolutamente tudo.
A solução bonapartista (poderíamos chamar-lhe proto-fascista) que Trump representa pode não oferecer a segurança e a estabilidade que a maioria do grande capital quer ver na corrida à Casa Branca mas, nos dias que correm, só restam tribunais para evitar o que as urnas já não garante, provaram-no os oito candidatos. A falta de precedente histórico no ar — discute-se se um preso pode ser eleito presidente ou se um condenado está impedido de se candidatar — é augúrio de uma fractura maior.