Venezuela reafirma direito histórico sobre a região de Esequibo

«O único ven­cedor do re­fe­rendo é o povo da Ve­ne­zuela e a so­be­rania da Ve­ne­zuela e os per­de­dores são o go­verno da Guiana, a Ex­xon­Mobil e o im­pe­ri­a­lismo norte-ame­ri­cano», afirmou o pre­si­dente da Re­pú­blica Bo­li­va­riana da Ve­ne­zuela, Ni­colás Ma­duro, co­men­tando os re­sul­tados do re­fe­rendo re­a­li­zado no do­mingo sobre a dis­puta ter­ri­to­rial que a Ve­ne­zuela mantém com a Guiana em torno da re­gião de Ese­quibo, que nos úl­timos meses se in­ten­si­ficou com as queixas de Ca­racas de que Ge­or­ge­town está a en­tregar áreas ma­rí­timas in­de­ter­mi­nadas a em­presas pe­tro­lí­feras como a norte-ame­ri­cana Ex­xon­Mobil.

No re­fe­rendo, de ca­rácter con­sul­tivo, mais de 95% dos ve­ne­zu­e­lanos que nele par­ti­ci­param (mais de me­tade da po­pu­lação) res­pon­deram afir­ma­ti­va­mente às cinco per­guntas co­lo­cadas, sendo uma delas re­la­tiva à cri­ação do Es­tado da Guayana Ese­quiba e à sua in­clusão no mapa do ter­ri­tório ve­ne­zu­e­lano.

Trata-se de uma dis­puta an­tiga, ini­ciada na pri­meira me­tade do sé­culo XIX, opondo então a Ve­ne­zuela ao im­pério bri­tâ­nico, que co­lo­ni­zava este ter­ri­tório. De­pois de, numa pri­meira fase, os bri­tâ­nicos terem re­co­nhe­cido a in­de­pen­dência da Grande Colômbia e, pos­te­ri­or­mente, a Re­pú­blica da Ve­ne­zuela, cujas fron­teiras in­cluíam a re­gião dis­pu­tada, em 1840 o tra­çado foi re­visto uni­la­te­ral­mente pelo Reino Unido: para as au­to­ri­dades ve­ne­zu­e­lanas, es­tava-se então pe­rante uma ane­xação ilegal da­quele ter­ri­tório.

Em 1899, um tri­bunal de Paris de­cretou que grande parte da re­gião de Ese­quibo es­taria sob ju­ris­dição do Reino Unido. No en­tanto, meio sé­culo de­pois, seria des­co­berta a ne­go­ci­ação se­creta por de­trás dessa de­cisão, o que pro­vocou a sua anu­lação e re­jeição por parte da Ve­ne­zuela.

O go­verno ve­ne­zu­e­lano de então levou o caso às Na­ções Unidas e, em 1966, foi as­si­nado em Ge­nebra um acordo entre a Ve­ne­zuela, o Reino Unido e a então co­lónia da Guiana Bri­tâ­nica, no qual se re­co­nhecia a exis­tência de uma dis­puta ter­ri­to­rial e se es­ta­be­lecia os pro­ce­di­mentos para en­con­trar uma so­lução ne­go­ciada.

Este pro­blema, her­dado do co­lo­ni­a­lismo bri­tâ­nico, per­ma­neceu sem res­posta du­rante dé­cadas, pese em­bora as ten­ta­tivas das au­to­ri­dades ve­ne­zu­e­lanas – so­bre­tudo desde 1999, com Hugo Chávez e, pos­te­ri­or­mente, Ni­colas Ma­duro na Pre­si­dência da Re­pú­blica Bo­li­va­riana da Ve­ne­zuela – para o re­solver: re­a­fir­mando os di­reitos his­tó­ricos e ju­rí­dicos da Ve­ne­zuela sobre o ter­ri­tório, re­cu­sando sempre qual­quer so­lução mi­litar para o di­fe­rendo, re­pu­di­ando toda a es­pécie de pro­vo­ca­ções e apos­tando na di­plo­macia e nas ne­go­ci­a­ções no quadro do acordo de Ge­nebra de 1966.

A re­gião, com cerca de 160 mil qui­ló­me­tros qua­drados e vastas re­servas pe­tro­lí­feras, tem sido palco de pro­vo­ca­ções dos EUA, através de em­presas como a Ex­xon­Mobil e do Co­mando Sul das Forças Ar­madas norte-ame­ri­canas. As au­to­ri­dades bo­li­va­ri­anas acusam os EUA de pre­ten­derem apo­derar-se dos va­li­osos re­cursos ener­gé­ticos de Ese­quibo e de uti­li­zarem a Guiana como base para a de­ses­ta­bi­li­zação da Ve­ne­zuela.

As ou­tras quatro per­guntas do re­fe­rendo re­la­ci­o­navam-se com a re­cusa da frau­du­lenta de­cisão ju­di­cial de Paris, de 1899; com o apoio ao acordo de Ge­nebra de 1966 como o «único ins­tru­mento ju­rí­dico vá­lido para al­cançar uma so­lução prá­tica e sa­tis­fa­tória para a Ve­ne­zuela e a Guiana»; com o não re­co­nhe­ci­mento da ju­ris­dição do Tri­bunal In­ter­na­ci­onal de Jus­tiça para re­solver a con­tro­vérsia; e com o de­sa­cordo quanto às pre­ten­sões da Guiana de dispor ile­gal­mente da pla­ta­forma ma­rí­tima não de­li­mi­tada.

Após a re­a­li­zação do re­fe­rendo, Ni­colás Ma­duro re­a­firmou que apenas o Acordo de Ge­nebra, «sem pro­vo­ca­ções, sem ar­ro­gância, sem dis­cursos bé­licos», é o único ins­tru­mento legal para di­rimir a dis­puta ter­ri­to­rial, su­bli­nhando que este será apli­cado com vista a al­cançar um «acordo di­plo­má­tico justo, sa­tis­fa­tório para as partes e ami­gável como são as li­nhas do di­reito in­ter­na­ci­onal» e acon­se­lhando os EUA a fi­carem «longe daqui», dei­xando «que a Guiana e a Ve­ne­zuela, em paz, re­solvam este as­sunto».




Mais artigos de: Internacional

Capitalismo não rima com defesa do ambiente

De­corre no Dubai, até ao pró­ximo dia 12, a 28.ª Con­fe­rência das Partes no âm­bito das Con­ven­ções Quadro sobre Al­te­ra­ções Cli­má­ticas das Na­ções Unidas (COP28). O de­pu­tado do PCP no Par­la­mento Eu­ropeu, João Pi­menta Lopes, está pre­sente.

Níger e Burquina Fasso abandonam «G5 Sahel»

O Níger e o Bur­quina Fasso anun­ci­aram, no dia 3, a sua re­ti­rada da co­or­de­nação mi­litar de­no­mi­nada «G5 Sahel», con­si­de­rando que a mesma serve os in­te­resses fran­ceses e afecta a so­be­rania dos países en­vol­vidos. O Mali tinha já saído em 2022.

Mais mísseis norte-americanos a caminho da Ásia

Os EUA estão a planear instalar, já em 2024, mísseis de médio alcance em bases da região Ásia-Pacífico. A notícia é do portal Defense One, próximo do Pentágono e especializado em assuntos militares, e cita declarações do general norte-americano Charles Flynn no Fórum Internacional de Segurança...

Kissinger, cem anos sem perdão

A morte é a verdadeira maioria silenciosa – e é absolutíssima: para cada coração que ainda bate, 15 houve que não voltarão a bater. Aos cem anos, o coração frio de Henry Kissinger inscreveu finalmente o dono na maioria dos calados. Mentiu, em 69, quando disse aos jornalistas que dentro do envelope levava a Playboy. Na...