Este e outro Abril
No início de Abril de 1949, mais precisamente no dia 4, foi assinado em Washington o tratado fundador da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO na sigla inglesa). Constavam nesse documento as assinaturas dos representantes de 12 Estados, entre as quais as de José Caeiro da Mata e Pedro Teotónio Pereira, em nome de Portugal.
Entre os fundadores da aliança militar do autoproclamado mundo livre encontrava-se, assim, um país submetido a uma ditadura fascista e colonialista onde funcionava um campo de concentração e um vasto e brutal complexo prisional, a PIDE torturava e assassinava impunemente, os povos colonizados estavam sujeitos a um cruel regime de discriminação e trabalhos forçados e as liberdades eram negadas. Um país, dizia o poeta, onde o pão era contado e onde morria primeiro quem nascia desgraçado.
Se Portugal garantiu aos EUA apoio para a sua Guerra Fria, uma importante base a meio do Atlântico e acesso privilegiado à economia nacional e às colónias africanas, a NATO sustentou a ditadura, permitindo-lhe sobreviver à derrota dos seus aliados ideológicos na Segunda Guerra Mundial e subsistir por mais duas décadas e meia.
Nada que surpreenda, verdadeiramente. A NATO da defesa dasliberdades, da democracia e dos direitos humanos nunca existiu para lá da propaganda. Pelo contrário, serviu sempre para garantir a supremacia dos EUA, submetendo os ditos «aliados» e confrontando quem quer que a desafiasse. Independentemente das consequências.
Mas nesse mesmo Abril de 1949, alguns dias mais tarde, realizava-se em Paris e em Praga, simultaneamente,o primeiro Congresso Mundial dos Partidários da Paz. Oriundas de 72 países, com formações e convicções diversas, as mais de 2000 pessoas presentes – em representação de milhares de outras – iniciavam ali a construção de um amplo movimento global de defesa da paz, do desarmamento e dos direitos dos povos, que apesar da repressão e da censura teve expressão em Portugal: oapelo de Estocolmo, pela proibição das armas nucleares, e a exigência de um Pacto de Paz entre as grandes potências, em oposição à lógica de blocos militares antagónicos iniciada pela NATO, mobilizaram então milhões em todo o mundo, contribuindopara travaros ímpetos mais agressivos do imperialismo.
Passados 75 anos, neste Abril em que vivemos, o País arrisca-se a ser envolvido em aventuras belicistas ao serviço de interesses alheios, que uma vez mais trazem consigo a propaganda militarista, a caça às bruxas, o desvio de crescentes recursos financeiros para a fogueira da guerra. Amanhã, nas comemorações populares do 25 de Abril, erguer-se-á mais uma barreira contra a guerra – e contra o sistema opressor e injusto que a fomenta e dela se alimenta.