O SNS está a ser desmantelado para servir os lucros do privado

«O povo me­rece mais SNS» e «pú­blico é de todos, pri­vado é só de al­guns» foram al­gumas das pa­la­vras de ordem ou­vidas na acção pro­mo­vida pelo PCP, dia 22, junto ao Hos­pital do Bar­reiro, contra o en­cer­ra­mento das ur­gên­cias de Obs­te­trícia e blocos de partos no SNS.

A si­tu­ação ac­tual do SNS é fruto de uma opção po­lí­tica de­li­be­rada

Paula Santos de­nun­ciou o de­sin­ves­ti­mento no SNS e acusou o Go­verno de se­guir o mesmo rumo para servir os grupos pri­vados

Não é por acaso, por in­com­pe­tência ou por in­ca­pa­ci­dade que o Ser­viço Na­ci­onal de Saúde está como está. Trata-se, sim, do re­sul­tado de uma opção po­lí­tica de­li­be­rada de en­fra­que­ci­mento e des­man­te­la­mento do ser­viço pú­blico e uni­versal de Saúde para abrir ca­minho aos grupos pri­vados que operam no sector, que crescem (e au­mentam os seus lu­cros) à me­dida que di­minui a ca­pa­ci­dade de res­posta pú­blica às ne­ces­si­dades das po­pu­la­ções. Esta opção une, nas suas li­nhas es­sen­ciais, PS, PSD e CDS, a que mais re­cen­te­mente se jun­taram também Chega e IL.

Esta foi uma das ideias cen­trais da in­ter­venção de Paula Santos, de­pu­tada e di­ri­gente do PCP, na con­cen­tração re­a­li­zada faz hoje uma se­mana junto ao Hos­pital da Nossa Se­nhora do Ro­sário, no Bar­reiro, onde os ser­viços de ur­gência de Gi­ne­co­logia e Obs­te­trícia e o bloco de partos en­cerram in­ter­mi­ten­te­mente desde o Verão de 2022. En­tre­tanto, e não muito longe dali, está em cons­trução uma «grande uni­dade de um dos prin­ci­pais grupos pri­vados do nosso país», de­nun­ciou a di­ri­gente co­mu­nista.

Também neste as­pecto, o con­celho da margem Sul do Tejo não é caso único. Em todo o País flo­rescem hos­pi­tais e clí­nicas pri­vadas, cuja ren­ta­bi­li­dade é ga­ran­tida pre­ci­sa­mente pela cres­cente fra­gi­li­dade da res­posta pú­blica, es­va­ziada pelo acen­tuado de­sin­ves­ti­mento ve­ri­fi­cado nas úl­timas dé­cadas. As me­didas anun­ci­adas re­cen­te­mente pelo Go­verno apenas in­ten­si­fi­carão este rumo, de­nun­ciou Paula Santos.

So­lu­ções só para o pri­vado
Ava­li­ando essas me­didas, a pre­si­dente do Grupo Par­la­mentar do PCP su­bli­nhou não haver, entre elas, uma única des­ti­nada a va­lo­rizar os pro­fis­si­o­nais de saúde, os seus sa­lá­rios, car­reiras e con­di­ções de tra­balho. E é pre­ci­sa­mente a ca­rência de pro­fis­si­o­nais – mé­dicos, en­fer­meiros, téc­nicos – um dos prin­ci­pais es­tran­gu­la­mentos que afectam o de­sem­penho do SNS e põem em causa a uni­ver­sa­li­dade do di­reito à Saúde. Os pro­fis­si­o­nais, sa­li­entou, são fun­da­men­tais para «as­se­gurar os partos, as con­sultas, os tra­ta­mentos e os exames a que todos temos di­reito».

O mesmo não acon­tece, porém, com as me­didas que visam trans­ferir mais cui­dados e re­cursos do Ser­viço Na­ci­onal de Saúde para os grupos pri­vados, no­me­a­da­mente ope­ra­ções, con­sultas e exames, através de con­tra­tu­a­li­za­ções e de par­ce­rias: já hoje, mais de me­tade do or­ça­mento do SNS vai parar aos co­fres dos grupos pri­vados e o Go­verno PSD-CDS pre­tende au­mentar ainda mais estas trans­fe­rên­cias – e, por acrés­cimo, os lu­cros destes grupos.

Paula Santos re­feriu-se a duas me­didas anun­ci­adas por Luís Mon­te­negro, sin­to­má­ticas destas op­ções: uma, a cri­ação das cha­madas Uni­dades de Saúde Fa­mi­liar Tipo C, que mais não é do que a in­tenção de pri­va­tizar os cui­dados de saúde pri­má­rios; outra, o adi­a­mento do con­curso de re­cru­ta­mento de mé­dicos recém-for­mados, per­mi­tindo assim ao sector pri­vado con­tratar muitos deles. A estas acresce o blo­queio ne­go­cial que per­ma­nece, no­me­a­da­mente com os mé­dicos.

Mais de uma cen­tena de pes­soas res­pondeu ao apelo do PCP e pro­testou no Bar­reiro contra a de­gra­dação do SNS

No Bar­reiro como no País
Antes de Paula Santos in­ter­veio, Jés­sica Pe­reira, membro do Exe­cu­tivo da Co­missão Con­ce­lhia do Bar­reiro do PCP, ela pró­pria grá­vida de seis meses e utente da­quele hos­pital: «As­sis­timos a um re­tro­cesso de dé­cadas no con­celho do Bar­reiro. Quantos anos te­remos de re­cuar até en­con­trar ge­ra­ções nas­cidas noutro con­celho?» Com grande pro­ba­bi­li­dade, é o que su­ce­derá a muitos bebés du­rante os pró­ximos meses, na Pe­nín­sula de Se­túbal (onde o pro­blema atinge também os hos­pi­tais de Al­mada e Se­túbal) como em muitas ou­tras re­giões, já que são por estes dias vá­rias as ur­gên­cias obs­té­tricas e os blocos de partos en­cer­rados.

Como sa­li­entou a jovem di­ri­gente co­mu­nista, as mu­lheres grá­vidas e em tra­balho de parto são en­ca­mi­nhadas para qui­ló­me­tros de dis­tância da sua re­si­dência, «au­men­tando a ins­ta­bi­li­dade, a in­cer­teza e a pro­ba­bi­li­dade de com­pli­ca­ções daí de­cor­rentes». Ao mesmo tempo, acres­centou, não se con­segue marcar as ne­ces­sá­rias eco­gra­fias em tempo útil, em­pur­rando muitas mu­lheres para o sector pri­vado, e são muitas as grá­vidas sem o de­vido acom­pa­nha­mento por não terem mé­dico de fa­mília. As mu­lheres imi­grantes so­frem de forma acres­cida com esta si­tu­ação, afirmou.

Jés­sica Pe­reira re­cordou ainda que os pro­blemas do Hos­pital do Bar­reiro não in­cidem apenas sobre a obs­te­trícia e os blocos de partos. O ser­viço de Ur­gência Pe­diá­trica tem es­tado en­cer­rado e no início deste ano também fe­chou o ser­viço de Ur­gência Car­di­o­ló­gica. Em al­gumas es­pe­ci­a­li­dades as listas de es­pera são su­pe­ri­ores a um ano. Nos cui­dados de Saúde pri­má­rios, de­nun­ciou, «au­menta o nú­mero de utentes sem mé­dico de fa­mília» e «tardam em re­a­brir os três cen­tros de saúde en­cer­rados».

Ambas as ora­doras re­a­fir­maram que a luta em de­fesa do SNS vai con­ti­nuar, com os co­mu­nistas na frente.

 

As so­lu­ções ur­gentes

Paula Santos con­trapôs às me­didas anun­ci­adas pelo pri­meiro-mi­nistro (como à prá­tica po­lí­tica do PS, se­me­lhante nas li­nhas fun­da­men­tais) o Plano de Emer­gência para o SNS apre­sen­tado há meses pelo PCP. Nele são apon­tadas me­didas que, no ime­diato, in­ver­te­riam a di­fícil si­tu­ação que se vive no sector.

Um pri­meiro grupo de me­didas visa con­tratar mais, atrair e reter pro­fis­si­o­nais, me­lho­rando as con­di­ções de tra­balho: a de­di­cação ex­clu­siva de mé­dicos e en­fer­meiros; a cri­ação de um novo re­gime de in­cen­tivo à fi­xação de pro­fis­si­o­nais em zonas ca­ren­ci­adas; o alar­ga­mento das va­lên­cias no SNS, com cor­res­pon­dente con­tra­tação de pro­fis­si­o­nais; re­visão ne­go­ciada das car­reiras; a ne­go­ci­ação com as or­ga­ni­za­ções re­pre­sen­ta­tivas dos tra­ba­lha­dores da saúde de um re­gime de pro­moção do re­gresso de pro­fis­si­o­nais saídos do SNS nos úl­timos anos; e o au­mento sig­ni­fi­ca­tivo das vagas dis­po­ní­veis nas fa­cul­dades de me­di­cina do En­sino Su­pe­rior pú­blico.

Os co­mu­nistas pro­põem ainda ou­tras me­didas, agru­padas em di­versas áreas: 1) a me­lhoria do acesso aos cui­dados de saúde e a me­di­ca­mentos; 2) o re­forço dos meios fi­nan­ceiros e téc­nicos vi­sando o au­mento da ca­pa­ci­dade do SNS; 3) uma me­lhor or­ga­ni­zação dos ser­viços, com ar­ti­cu­lação e gestão de­mo­crá­tica; e 4) dis­ci­plinar as re­la­ções do Es­tado com o sector pri­vado.

 



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