Defender a paz e o desarmamento é também lutar por direitos e condições de vida
A luta contra o militarismo e a guerra, pela paz e o desarmamento está na ordem do dia, num momento em que a ofensiva belicista do imperialismo torna o mundo cada vez mais instável e perigoso: denunciar a política de confrontação e guerra promovida pelos EUA, a UE e a NATO; travar o aumento das despesas militares; defender a melhoria das condições de vida, os direitos e as liberdades, são combates do nosso tempo.
É preciso romper com a política militarista e de guerra dos EUA, da NATO e da UE e defender a paz e o desarmamento
“Defesa”, “segurança”, “investimento” são alguns dos termos usados no discurso político e mediático “oficial” para esconder o que verdadeiramente está em causa: um amplo processo de militarização à escala global, incluindo da União Europeia, inserido na política de confrontação do imperialismo, no âmbito do qual se pretendem desviar vastos recursos públicos para o armamento e a guerra. Recursos estes que serão retirados aos salários e às pensões, à saúde, à educação, à protecção social, à habitação, à cultura, ao desporto, para entregar milhões e milhões à indústria do armamento, ao negócio da morte e da destruição.
Dados recentemente divulgados confirmam esta realidade (ver exemplos nestas páginas).
Se, durante anos, o patamar do dito “investimento” militar no âmbito da NATO (não aquele útil e necessário para que as Forças Armadas Portuguesas cumpram as suas funções constitucionais, mas o outro, ao serviço do imperialismo) esteve apontado aos 2% do PIB, pretende-se agora que seja elevado aos 3% e até aos 5%.
As consequências deste rumo belicista poderão ir mais longe: não só elevam os riscos de guerra como conduzem ao aumento dos preços de bens essenciais e à degradação das condições de vida, ao ataque a direitos e liberdades democráticas, à promoção e banalização de discursos de ódio, da xenofobia, da violência.
Romper com a submissão
Portugal precisa de se libertar da submissão aos EUA, à NATO e à UE, que há décadas marca a sua política externa. Aliás, se há matéria em que PS e PSD (e também o CDS, a IL e o Chega) convergem, esta política de submissão é sem dúvida uma delas. O próprio Livre – com outra argumentação, é certo – advoga o caminho militarista, de aumento das despesas militares e de promoção da lógica de blocos político-militares, partilhando “ameaças” com os demais e defendendo igualmente um maior reforço da componente militarista da União Europeia (que, como consagram os tratados, se encontra subordinada à NATO).
Recorde-se que durante a campanha eleitoral, PSD e PS concordaram em activar a “Cláusula de derrogação nacional” do Pacto de Estabilidade, que permitirá o aumento das despesas militares do País no quadro da NATO (ver caixa).
No Compromisso Eleitoral com que se apresentou às legislativas de 18 de Maio, e que cumprirá na próxima legislatura, o PCP rejeita «qualquer envolvimento das Forças Armadas portuguesas em conflitos ao serviço da NATO e da UE, em confronto com a missão que lhes está constitucionalmente consagradas» e considera «inaceitável o desvio de vastos recursos, que sistematicamente têm sido negados para resolver os problemas dos trabalhadores e do povo, para despesas militares e para a guerra», demonstrando quem efectivamente tem defendido e continuará a defender a Paz.
O que afirma a Constituição
A Constituição da República Portuguesa consagra, no seu artigo 7.º, os princípios que regem (ou deveriam reger) as relações internacionais do País. Se a prática política do PCP é totalmente consonante com ela, o mesmo não podem dizer outros partidos, que nada mais têm a oferecer do que a submissão aos EUA, à NATO e à UE.
É a Constituição que determina que Portugal se rege pelos princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação e o progresso da humanidade.
Aponta ainda a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos, o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos.
Reconhece ainda o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento.
Para a guerra nunca falta nada...
O Governo PSD/CDS, em gestão, solicitou à Comissão Europeia para activar a “Cláusula de derrogação nacional” no âmbito do Pacto de Estabilidade, que permite aos Estados-Membros que integram a UE aumentarem as suas despesas militares sem que isso interfira no cálculo do défice. Este mecanismo foi criado pela Comissão Europeia como parte da escalada armamentista e de guerra promovida pela UE, exposta no eufemisticamente chamado Livro Branco sobre a Defesa Europeia, Prontidão 2030 e articula-se com o programa ReArm Europe – como se o conjunto de países que integram a UE já não gastassem centenas de milhares de milhões de euros em armamentos. O Governo informou que a decisão foi «consensualizada» com o PS.
Esta notícia é reveladora a vários níveis. Internamente revela não só uma convergência entre PSD/CDS e PS nesta que é uma questão determinante (a que, no essencial, se pode juntar IL, Chega e Livre, já que todos concordam com a prioridade concedida ao “rearmamento”). Pelo vistos, não há limitações para desviar milhares de milhões ao longo dos anos para a indústria do armamento, que tanta falta fazem na saúde, na educação, na habitação, nos salários e nas pensões.
Externamente, é particularmente reveladora da natureza militarista da União Europeia e de como a sua retórica “social” é apenas isso, retórica. A excepção agora aberta no âmbito do Pacto de Estabilidade da UE para o armamento foi sempre travada quando se tratava de investir na coesão, no desenvolvimento, na resposta aos problemas sociais.
O que os números revelam
Nunca se gastou tanto em armamento
O Instituto Internacional de Estocolmo para os Estudos da Paz (SIPRI) divulgou há dias os dados sobre as despesas militares mundiais relativas a 2024, as mais elevadas desde que as regista. Há números reveladores:
-
Os 2718 milhares de milhões de dólares gastos no ano passado representam um crescimento de 9,4% relativamente a 2023 (o maior aumento anual desde há mais de 30 anos) e uns extraordinários 37% face a 2015.
-
Pelo segundo ano consecutivo, as despesas militares cresceram em todas as regiões do mundo, com particular incidência no Médio Oriente e na Europa. Se Israel foi o país que registou o maior aumento anual (+65% entre 2023 e 2024), no continente europeu as despesas militares cresceram 17%, para 693 mil milhões de dólares. O SIPRI nota que «todos os países europeus aumentaram os seus gastos militares em 2024, à excepção de Malta».
-
Com 997 mil milhões gastos em 2024 (+5,7% do que no ano anterior), os EUA continuam – de longe – a ser quem mais fundos destina ao sector militar, representando sozinhos 37% do total mundial. Este valor inclui 37,7 mil milhões para a modernização do seu arsenal nuclear, 29,8 mil milhões para sistemas ditos “anti-míssil”, 61,1 mil milhões em armamento para a frota de aviões F-35 e 48,1 mil milhões para novos navios de guerra. 2,6 mil milhões de dólares foram ainda canalizados para reforçar as capacidades militares «próprias e dos aliados» na região da Ásia-Pacífico e mais 3,3 mil milhões para reforçar a base industrial de submarinos norte-americanos no quadro do AUKUS, acordo militar entre EUA, Reino Unido e Austrália igualmente centrado na Ásia-Pacífico. Recorde-se que os EUA anunciaram já o aumento das suas despesas militares para 2026.
-
A NATO, em conjunto, representou 55% das despesas militares do mundo, num total de 1506 mil milhões de dólares: isto significa que os seus 32 membros têm gastos militares maiores do que os restantes 161 Estados com assento na Organização das Nações Unidas. Dos 32 membros da NATO, 18 atingiram ou ultrapassaram o patamar dos 2% do PIB para despesas militares, assumido como propósito em 2014 (em 2023, eram 11). Os membros europeus da NATO têm já despesas combinadas de 454 mil milhões de dólares.
-
A República Popular da China gastou 314 mil milhões de dólares em 2024, cerca de um terço do que foi gasto pelos EUA, ficando em segundo lugar. A Federação Russa ficou-se pelos 149 mil milhões, bem atrás dos EUA e dos membros europeus da NATO combinados, respectivamente quase 7 vezes menos e cerca de 3 vezes menos, ficando em terceiro lugar. A Alemanha, a Índia, o Reino Unido, a Arábia Saudita, a Ucrânia, a França e o Japão completam o lote dos primeiros 10 países que mais gastam em despesas militares.
Na defesa da vida investe-se pouco
As crescentes despesas militares contrastam com a escassez de recursos para fazer face aos grandes problemas económicos, sociais e sanitários que permanecem, revelados por outros dados:
-
Para erradicar a fome no mundo até 2030, a Organização das Nações Unidas (ONU) estima que seja necessário investir anualmente mais 267 mil milhões de dólares por ano
-
4,2 mil milhões de dólares foi o valor orçamentado pela Organização Mundial de Saúde para 2025, correspondendo a menos 21% do que o inicialmente previsto (5,3 mil milhões) devido à perda de contribuições resultantes da saída dos EUA da organização
-
A Agência das Nações Unidas para a Infância, a UNICEF, que em 2025 conta com um orçamento de 8,5 mil milhões de dólares, projecta quebras de 20% no próximo ano, pela mesma razão: o desinvestimento dos EUA
Os povos perdem, mas há quem ganhe – e muito
Outro estudo do SIPRI, tornado público no final do ano passado, revelava interessantes factos e números acerca dos negócios de armamento referentes a 2023.
-
As receitas combinadas dos 100 maiores produtores e exportadores de armas do mundo aumentaram 4,2% em 2023, atingindo os 632 mil milhões de dólares. Relativamente a 2015, os aumentos ascendem a 19%
-
As cinco maiores empresas de armamento são norte-americanas: Lockheed Martin, RTX, Northrop Grumman, Boeing e General Dynamics