Pensar o futuro hoje, em África
Enquanto em Portugal paira um espectro – o da ingovernabilidade face à crescente resistência popular às políticas de exploração dos trabalhadores e de perda de soberania nacional, impostas pelo grande capital e seus governos a mando da Alemanha e do FMI –, chegam novidades dos países africanos de língua oficial portuguesa.
Em Angola iniciou-se uma nova etapa, após as eleições de 31 de Agosto. Os partidos ocuparam os seus assentos no parlamento dominado pelo MPLA, o presidente da República reeleito, José Eduardo dos Santos, tomou posse e, coadjuvado pelo novo vice presidente, Manuel Vicente, formou um governo de continuidade e renovação.
Os dirigentes angolanos querem prosseguir a consolidação da paz e da coesão nacional, a construção do crescimento económico e do desenvolvimento. O governo do MPLA estabeleceu como objectivos manter a estabilidade política, aprofundar a democracia, promover mais justiça social, «aumentar a riqueza nacional, fazer Angola crescer mais e distribuir melhor».
Em Moçambique, comemora-se hoje, 4 de Outubro, duas décadas de paz: em 1992, em Roma, o antigo presidente Joaquim Chissano e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, puseram fim a 16 anos de uma guerra que causou um milhão de mortos. Uma guerra cruel movida pela Renamo, com apoio da África do Sul racista, contra Moçambique independente.
Agora, no país vive-se a euforia do gás, do carvão, dos recursos minerais, das obras públicas, dos grandes negócios envolvendo por um lado investidores estrangeiros e por outro lado sectores da burguesia nacional florescente.
A Frelimo no poder reuniu há dias, em Pemba, o 10.º Congresso, donde saiu reforçado o seu líder e presidente da República, Armando Guebuza. No próximo ano há eleições autárquicas e, em 2014, presidenciais, colocando-se o problema da escolha do candidato do partido, já que Guebuza cumpre o segundo mandato e não pode recandidatar-se.
O Congresso da Frelimo não deu indicações sobre quem será o eleito nem tão-pouco foi unânime sobre outras questões actuais da sociedade moçambicana. Dirigentes históricos como Marcelino dos Santos (que participou no I Congresso da Frelimo, há 50 anos, na Tanzânia), Jorge Rebelo ou Graça Machel deram voz a preocupações populares – a necessidade de reforçar a unidade nacional, de «aproximar o partido do povo», de combater comportamentos «reprováveis» e, sobretudo, de lutar contra as desigualdades sociais geradas por um processo de desenvolvimento cujos benefícios tardam em chegar a todos.
Da Guiné-Bissau, as novas vêm de Nova Iorque. Representantes do governo constitucional – derrubado pelo golpe de Estado militar de 12 de Abril –, apoiados pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), tentaram usar da palavra na 67.ª Assembleia Geral das Nações Unidas. Mas não o conseguiram, torpedeados pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), onde pontificam Nigéria, Senegal, Costa do Marfim e Burkina Faso, que apoiam os golpistas e as autoridades impostas em Bissau.
A boa notícia é que, sob os auspícios da União Africana, teve lugar um encontro na sede dessa organização em Nova Iorque entre o presidente da República deposto, Raimundo Pereira, e o presidente «de transição» nomeado pelos golpistas, Serifo Nhamadjo. As instâncias internacionais procuram, assim, ultrapassar divergências entre as facções guineenses e seus apoiantes, no sentido de encontrar uma solução que reponha a legitimidade no complexo xadrez da Guiné-Bissau e da África Ocidental.
Em Cabo Verde, o PAICV organizou no fim-de-semana passado uma conferência nacional para «Pensar o futuro, hoje».
No governo desde 2001 e com um mandato renovado até 2016, o partido liderado por José Maria Neves fez um balanço positivo do percurso de Cabo Verde: «O país não é igual ao que tínhamos há 37 anos, nem há 20 anos ou mesmo há 10 anos. Muita coisa mudou para melhor. Quase tudo mudou para melhor. E, em todas as grandes mudanças que fizeram este Cabo Verde ganhar, o PAICV tem uma marca indelével. A liderança do PAICV tem sido um factor da mudança e um vector da qualidade deste Cabo Verde de cada vez mais desenvolvimento».
Prometendo estabilidade até ao final do mandato, o presidente do partido e primeiro-ministro não deu certezas quanto às questões internas partidárias. Mas o PAICV – que convocou um congresso para 2013, antecedido por eleições directas para a liderança – vai continuar a governar o país, procurando «acelerar a agenda de transformação de Cabo Verde».