Entrevista com Pedro Penilo,
responsável pela exposição de fotografia da Festa do Avante!
de 2002
O ano da fotografia
Miguel Inácio texto Jorge Cabral e Arquivo fotos
Para a edição de 2002, a organização da Festa do
Avante! programou uma série de iniciativas destinadas a pôr em
destaque a fotografia, como meio técnico de expressão e documentação,
visuais e artísticas, determinante para a nossa memória histórica
e pessoal, bem como instrumento de acção e transformação
das realidades política, cultural e artística.
O Pavilhão Central da Festa irá proporcionar ao visitante uma
exposição de grande formato de exemplos comentados, e de utilizações
diversificadas, que os artistas deram à fotografia, enquanto disciplina
artística autónoma, ao longo da sua história de mais de
um século e meio.
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Sebastião Salgado ( Refugee ) |
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Robert Capa ( Moment of Death ) |
A exposição pretende assim demonstrar que o fotógrafo, mormente o artista, nunca se limita a recolher fragmentos da realidade visual.
«Este ano escolhemos a fotografia como tema central da Festa do Avante!. Não irá ser a única disciplina artística, vai continuar a haver outras expressões, mas as suas características centrais serão dedicadas a este tipo de arte. Queremos mostrar que a fotografia é uma disciplina artística extremamente diversa e diversificada», disse ao Avante! Pedro Penilo, responsável pela exposição de fotografia.
«Uma das iniciativas a que nós chamamos Um olhar que transforma pretende dar exemplos não de uma exposição de fotografia mas de uma exposição sobre fotografia», afirmou. «O objectivo é mostrar exemplos de como ao longo da sua história a fotografia foi utilizada para objectivos diversos. Há uma tendência para ver a fotografia como uma simples captação mecânica de fragmentos da realidade. O que vamos mostrar é que a fotografia é sempre manipulada, porque exige a escolha do assunto de que se está a falar». Além disso, «exige uma escolha das condições mecânicas e técnicas em que essa escolha é feita», disse.
Pedro
Penilo salientou ainda que a história da fotografia vai desde a forma
mais popularizada, que no fundo é a actividade do repórter fotográfico,
até um outro polo da actividade do fotógrafo que é a montagem.
«Aqui os fragmentos da realidade são compostos de uma forma intencional e subjectiva que não deve ser confundida com a ideia redutora do fotógrafo, que se limita a captar a realidade tal como ela é», diz Penilo, sublinhando que «o campo de possibilidades vai desde a subtil, mas muito refinada, intervenção do fotógrafo, no momento de produção de um instantâneo, à estudada composição de uma natureza morta, de um nu, ou de uma fotomontagem; desde a criação de uma imagem como objecto artístico definitivo até à sua utilização como parte de um todo, onde podem entrar em jogo outras disciplinas como a escrita, a música, etc.; desde a produção de fotografias como objectos artísticos 'puros' até à sua integração em projectos híbridos, de cariz documental, político ou de investigação».
A mulher e a fotografia
O papel da mulher na fotografia foi bastante importante na história da arte. A democratização da fotografia permitiu que a mulher tivesse um papel que nunca antes tinha tido.
«Pela primeira vez, e graças à fotografia, a mulher passa a ter não só uma participação quantitativa como também qualitativa na história das artes plásticas», afirmou o responsável da iniciativa.
«Com a entrada das mulheres na história da arte da fotografia criam-se novos temas e novas sensibilidades. A fotografia traz consigo, não só um número maior de autores a produzir imagens, como também realidades socioculturais mais diversificadas, o que permite uma diversidade de temas que até então não era diversificada», referiu.
«Quando fazemos uma revisão da história da arte observamos que dos nomes que marcaram a evolução da fotografia na história das artes aparecem sempre nomes de mulheres», concluiu.
Fotógrafos de todos os matizes: participai!
Fotógrafos
amadores e profissionais, fotógrafos de fim de semana e de trazer por
casa, maus, bons e assim-assim acolheram, e continuam a acolher, o convite da
Festa de contribuir para um gigantesco «álbum de família»
daqueles que ao longo de 25 anos visitaram a Festa do Avante!.
Um painel com cerca de mil fotografias exporá as memórias mais queridas das Festas já realizadas. «O que nós queremos mostrar com a Fotofesta é que a fotografia permitiu ao longo dos tempos uma apropriação da criação artística pelas massas como nunca tinha acontecido», disse Pedro Penilo, acrescentando que «aquilo que marca a Festa do Avante! em relação às outras iniciativas culturais ou políticas é o seu conteúdo político e a componente de convívio e camaradagem».
«Esta iniciativa pretende ser uma demonstração disso mesmo através da fotografia. A fotografia possibilita a criação de laços e memórias e nós vamos associar estas duas vertentes num grande painel».
«Pedimos a todas as pessoas que participaram nas 25 edições das Festas que enviem as suas fotografias mais queridas para montar este painel, tipo um álbum gigante de fotografia, que será uma grande homenagem ao espirito da Festa».
A experiência de fotografar passou a ser uma experiência relativamente comum. Segundo Pedro Penilo, «todos nós já fotografamos ou já fomos protagonistas da fotografia. Por exemplo ao tirar uma fotografia com a nossa família assumimos que fazemos parte da história das imagens.
«O facto de podermos aspirar ser artistas, e todos nós ser-mos
objecto dessa fotografia, faz-nos sentir mais aptos para apreciar e julgar esta
arte de uma forma que não era, nem tem sido, comum nas restantes artes
visuais, onde a distância existente entre aquele que vê e a produz
é historicamente maior», disse.
«Avante!» Nș 1494 - 18.Julho.2002