Luís de Freitas-Branco (1890 -1955)

Luís de Freitas-Branco está para a mú­sica por­tu­guesa como Fer­nando Pessoa ou Sá Car­neiro estão para a nossa li­te­ra­tura, sendo hoje con­sen­su­al­mente re­co­nhe­cido como a prin­cipal fi­gura no pa­no­rama mu­sical por­tu­guês do sé­culo XX. É ele o in­tro­dutor do mo­der­nismo. Os po­emas sin­fó­nicos Pa­raísos Ar­ti­fi­ciais e Vathek são mo­nu­mentos so­noros que marcam essa mu­dança. A tal ponto que houve quem se re­cu­sasse a di­rigir este úl­timo por temer hos­ti­li­dades e o pri­meiro causou in­dig­nação pú­blica. Mas também fora do uni­verso sin­fó­nico ela se faz sentir (So­natas, Quar­teto). Os es­tudos que, por ini­ci­a­tiva do seu tio João, pôde efec­tuar em Paris e Berlim, tra­ba­lhando sobre a ori­en­tação de grandes mes­tres (Pâque, Hum­per­dinck), per­mi­tiram-lhe as­si­milar novas cor­rentes es­té­ticas. Mas a sua mú­sica nunca deixou de ter vin­cado cunho na­ci­onal, um in­dis­far­çável por­tu­gue­sismo que cons­ci­en­te­mente cul­tivou. As 4 sin­fo­nias que nos legou disso são exemplo.

Não foi apenas com­po­sitor. Foi um ge­nuíno ar­tista-in­te­lec­tual, es­pí­rito uni­versal, ra­ci­o­na­lista e ecléc­tico, que soube pensar a arte, a cul­tura e as con­tra­di­ções so­ci­o­po­lí­ticas do mundo em que viveu. Des­cen­dente da alta aris­to­cracia, co­meçou por ser mo­nár­quico, con­ser­vador e ca­tó­lico, mas com o andar do tempo tornou-se um in­te­lec­tual pro­gres­sista, ag­nós­tico e sim­pa­ti­zante dos ideais so­ci­a­listas de trans­for­mação so­cial. Uma evo­lução bem pa­tente no seu Diário.

Com V. da Mota re­a­lizou im­por­tan­tís­sima re­forma do en­sino ar­tís­tico no Con­ser­va­tório(1919), tendo a sua acção pe­da­gó­gica in­fluído nas ge­ra­ções se­guintes. Joly Braga Santos e Lopes-Graça foram os seus prin­ci­pais dis­cí­pulos.


Suite Alen­te­jana


LFB
con­si­de­rava-se alen­te­jano, em­bora não ti­vesse nas­cido nessa re­gião. Mas pos­suía uma pro­pri­e­dade em Re­guengos de Mon­saraz, o “Monte dos Per­di­gões”,onde pas­sava largo tempo, tendo aí com­posto boa parte das suas obras, e nunca es­condeu o fas­cínio que a pai­sagem ge­o­grá­fica e hu­mana dessas pa­ra­gens lhe cau­sava. Numa al­tura em que ainda não se fa­lava de et­no­mu­si­co­logia, LFB ano­tava em pe­quenos blocos de que se fazia acom­pa­nhar temas que es­cu­tava nas es­pon­tâ­neas ma­ni­fes­ta­ções mu­si­cais dos tra­ba­lha­dores alen­te­janos com quem con­vivia e que o de­sig­navam de “fi­dalgo co­mu­nista”. A 1ªSuite, que se supõe datar de 1919 (o ma­nus­crito perdeu-se) é efeito dessa atenção fol­clo­rista -- con­tendo temas re­co­lhidos in loco, de ou­vido -- e também re­sul­tado do pro­fundo afecto a esse mundo rural. Esta obra, por­ven­tura a mais po­pular de todas as par­ti­turas de LFB, é o nosso Alen­tejo feito mú­sica, Alen­tejo per mu­sica. No­tável ex­pressão ar­tís­tica (so­nora) da iden­ti­dade pro­funda de uma re­gião na sim­biose da na­tu­reza com o hu­mano que nela ha­bita. Ao con­trário do que acon­tece na forma suite mo­de­lada pelo Ro­man­tismo, não temos aqui mú­sica de pro­grama (v. nota sobre Rodeo). O Final, com o Fan­dango, é a úl­tima das 3 partes em que a obra se es­tru­tura. Note-se nas fan­farras (início e fim), na in­ter­venção do vi­o­lino solo, com pas­sa­gens de di­fícil exe­cução, e nos diá­logos tím­bricos que re­sultam dos con­trastes so­noros entre os vá­rios naipes da or­questra, bem como entre o co­lec­tivo ins­tru­mental (tutti) e um único ins­tru­mento (solo). O am­bi­ente fes­tivo, tra­du­zido na exu­be­rância dos ritmos, com­bina-se com um mo­mento in­ti­mista de re­flexão, an­te­ce­dendo a eu­foria con­clu­siva, do re­gresso à festa e à ale­gria di­o­ni­síaca.



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