Soberania e independência nacionais

Elemento essencial para o futuro progressista do País

O exer­cício da so­be­rania e da in­de­pen­dência na­ci­o­nais é es­sen­cial para ga­rantir o de­sen­vol­vi­mento do País e o bem-estar dos tra­ba­lha­dores e do povo. Esta foi uma das ideias cen­trais que so­bres­saiu da sessão pú­blica sobre este tema, re­a­li­zada no do­mingo em Lisboa, in­se­rida nas co­me­mo­ra­ções do cen­te­nário do nas­ci­mento de Álvaro Cu­nhal.

A questão na­ci­onal funde-se com a questão de classe

Pela pri­meira vez, por de­cisão do Go­verno de traição na­ci­onal que, a mando dos grupos eco­nó­micos trans­na­ci­o­nais e das grandes po­tên­cias da União Eu­ro­peia, des­go­verna o País, o 1.º de De­zembro não foi fe­riado em Por­tugal. Mas os co­mu­nistas, que com­batem a sub­missão do País aos in­te­resses do im­pe­ri­a­lismo e a ex­plo­ração e em­po­bre­ci­mento do seu povo – ques­tões que, ve­remos, há muito andam a par – não es­quecem esta im­por­tante data da His­tória (a Res­tau­ração da In­de­pen­dência, em 1640) e es­co­lheram este dia para de­bater o pen­sa­mento de Álvaro Cu­nhal e do PCP pre­ci­sa­mente sobre a so­be­rania e a in­de­pen­dência na­ci­o­nais. A abo­lição deste fe­riado me­receu, aliás, do Se­cre­tário-geral do PCP um co­men­tário sim­ples, mas in­ci­sivo: quem toma tal de­cisão «não está em con­di­ções de in­ter­pretar o sentir de um povo e de o re­pre­sentar».

Sim, porque, como também lem­brou Je­ró­nimo de Sousa, falar da de­fesa da so­be­rania e da in­de­pen­dência de Por­tugal é, pra­ti­ca­mente desde o início da sua his­tória en­quanto país, falar da acção das ca­madas po­pu­lares e da sal­va­guarda dos seus in­te­resses e as­pi­ra­ções: foi assim du­rante a re­vo­lução de 1383-85, quando a «ar­raia-miúda» a que se re­feria Fernão Lopes se le­vantou para de­fender a in­de­pen­dência do País posta em causa pela «traição da no­breza ter­ri­to­rial»; foi uma vez mais assim nos anos da ocu­pação fran­cesa e, de­pois, do do­mínio bri­tâ­nico de facto sobre Por­tugal. Foi o povo que ex­pulsou os in­va­sores e «se in­dignou e re­voltou para re­pu­diar o ul­ti­mato da grande po­tência in­glesa», ao mesmo tempo que as classes pos­si­dentes se sub­me­teram tor­nando pos­sí­veis tais ocu­pa­ções.

No­va­mente du­rante o fas­cismo, finda a Se­gunda Guerra Mun­dial, as classes do­mi­nantes viram na sub­missão ao im­pe­ri­a­lismo in­glês e norte-ame­ri­cano a sal­va­guarda do seu do­mínio no País. Sub­missão e do­mínio que – como sa­li­entou à época Álvaro Cu­nhal – sig­ni­fi­cavam a «ex­plo­ração da classe ope­rária por­tu­guesa em be­ne­fício dos mi­li­o­ná­rios in­gleses, ale­mães, belgas e fran­ceses e ou­tros que, ins­ta­lados co­mo­da­mente nos seus países, re­cebem o fruto do nosso tra­balho, das nossas pri­va­ções e da nossa mi­séria». Questão na­ci­onal e questão de classe estão, há muito, re­la­ci­o­nadas.

So­be­rania re­side no povo

Hoje, su­bli­nhou Je­ró­nimo de Sousa na in­ter­venção que en­cerrou a sessão, «são di­fe­rentes os me­ca­nismos de ex­torsão do País, mas os re­sul­tados dessa ex­pro­pri­ação se­guem o mesmo rumo». Por­tugal já não é o país co­lo­nial que foi até 1974, mas não se li­bertou ainda da con­dição de país co­lo­ni­zado, «no âm­bito da União Eu­ro­peia e, em geral, pelo im­pe­ri­a­lismo». Per­ma­necem os pro­pó­sitos e ob­jec­tivos da «sub­missão e su­bor­di­nação em re­lação aos se­nhores do Mundo por parte da classe do­mi­nante do nosso País».

Por mais que os go­ver­nantes se apre­sentem como de­fen­sores da so­be­rania e in­de­pen­dência do País, o que é facto, como su­bli­nhou o Se­cre­tário-geral do PCP, é que foram os par­tidos do Go­verno, mais o PS, que subs­cre­veram o pacto de agressão e en­tre­garam os des­tinos de Por­tugal à «hu­mi­lhante de­pen­dência da in­ter­venção es­tran­geira, con­cre­ti­zada pela troika FMI/​UE/​BCE». E são, também eles, que se re­cusam a propor a re­ne­go­ci­ação da dí­vida, que «su­foca e con­di­ciona» o de­sen­vol­vi­mento do País.

Mas a sub­missão ao im­pe­ri­a­lismo por parte da classe do­mi­nante e dos seus par­tidos, pre­ci­sa­mente os mesmos que com­põem a troika na­ci­onal (PS, PSD e CDS), não co­meçou com a as­si­na­tura do cha­mado «me­mo­rando de en­ten­di­mento». Ela re­monta, na his­tória re­cente, ao pro­cesso contra-re­vo­lu­ci­o­nário ini­ciado há 38 anos. A po­lí­tica de di­reita então en­ce­tada, «de­ter­mi­nada pelos in­te­resses dos grandes grupos eco­nó­micos e su­bor­di­nada à in­te­gração ca­pi­ta­lista da União Eu­ro­peia», ditou a en­trega nas mãos de grupos mo­no­po­listas na­ci­o­nais e es­tran­geiros das «ala­vancas ne­ces­sá­rias e im­pres­cin­dí­veis ao de­sen­vol­vi­mento do País e lu­cros imensos».

Ga­ran­tindo que Por­tugal «não está con­de­nado à sub­missão e à de­pen­dência», Je­ró­nimo de Sousa afirmou ser pos­sível as­se­gurar a so­be­rania e a in­de­pen­dência do País, es­sen­ciais para o bem-estar do seu povo. Mas para tal, acres­centou, é ne­ces­sária outra po­lí­tica, pa­trió­tica e de es­querda, como a que está pa­tente no Pro­grama do PCP de uma «De­mo­cracia Avan­çada, os Va­lores de Abril no Fu­turo de Por­tugal». Nesta pro­posta po­lí­tica, parte-se da ideia cen­tral de que a so­be­rania «não se ne­go­ceia, vende ou cede»; ela re­side no povo e «é a ele que per­tence a de­cisão do seu pre­sente e fu­turo co­lec­tivos».

Pa­trió­tica e de es­querda

Como re­pe­ti­da­mente es­creveu e afirmou Álvaro Cu­nhal, e a prá­tica de sempre do PCP con­firma, o ca­rácter emi­nen­te­mente pa­trió­tico do Par­tido e da sua acção re­vo­lu­ci­o­nária de forma ne­nhuma sig­ni­fica iso­la­mento, egoísmo, agressão ou na­ci­o­na­lismo. Pelo con­trário, pa­tri­o­tismo e in­ter­na­ci­o­na­lismo são duas ver­tentes que, só na apa­rência, po­derão ser con­si­de­rados con­tra­di­tó­rios, re­alçou Ângelo Alves, da Co­missão Po­lí­tica, na in­ter­venção de aber­tura da sessão.

São, sim, duas ver­tentes com­ple­men­tares da na­tu­reza, da ide­o­logia e da prá­tica po­lí­tica do PCP, que, mesmo nos tempos mais duros da luta contra o fas­cismo, nunca deixou de in­serir a sua acção na luta mais geral dos tra­ba­lha­dores e dos povos, de com ela aprender e de se so­li­da­rizar com aqueles que, em vá­rias partes do Mundo, com­ba­tiam o im­pe­ri­a­lismo. A ta­refa na­ci­onal é, acima de tudo, a «pri­meira con­tri­buição» que o povo por­tu­guês pode dar para a luta li­ber­ta­dora dos povos, pre­cisou Ângelo Alves.

Já Al­bano Nunes, do Se­cre­ta­riado, um dos ora­dores da sessão (ver pá­gina se­guinte), sa­li­entou que a «re­lação da questão na­ci­onal com a questão de classe é uma tese mar­xista-le­ni­nista que a ex­pe­ri­ência his­tó­rica por­tu­guesa bem com­prova» e que nestes tempos se torna «ainda mais evi­dente». Ci­tando Álvaro Cu­nhal em «O Par­tido com Pa­redes de Vidro», Al­bano Nunes afirmou que «a evo­lução do ca­pi­ta­lismo de­ter­mina a iden­ti­fi­cação cres­cente dos in­te­resses da classe ope­rária e das massas tra­ba­lha­doras com os in­te­resses na­ci­o­nais». Na po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda pela qual o PCP se bate, acres­centou, a de­fesa da in­de­pen­dência e da so­be­rania as­sume um «papel de pri­meiro plano».

Na in­ter­venção de en­cer­ra­mento, Je­ró­nimo de Sousa con­cre­tizou o con­teúdo desta po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda que o PCP propõe e cor­po­riza, so­bre­tudo no que res­peita à de­fesa da so­be­rania e da in­de­pen­dência, es­sen­cial para a con­cre­ti­zação das res­tantes. O Se­cre­tário-geral do PCP re­feriu-se, no­me­a­da­mente, à va­lo­ri­zação dos re­cursos na­ci­o­nais, à re­cu­pe­ração dos ins­tru­mentos po­lí­ticos e eco­nó­micos in­dis­pen­sá­veis ao de­sen­vol­vi­mento do País, à re­jeição das im­po­si­ções ex­ternas le­sivas dos in­te­resses na­ci­o­nais, à afir­mação do «pleno di­reito do povo por­tu­guês de de­cidir do seu pró­prio des­tino», à ne­ces­sária dis­so­lução da NATO, entre ou­tras ques­tões. Je­ró­nimo de Sousa ter­minou pre­ci­sa­mente ma­ni­fes­tando a sua con­fi­ança na pos­si­bi­li­dade de, com a sua luta, o povo por­tu­guês «as­se­gurar para si um fu­turo de li­ber­dade, de­mo­cracia, pro­gresso so­cial e paz». 




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Soberania é questão de classe

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