Dezenas de milhares em Madrid contra a lei Gallardón

Uma lei medieval contra as mulheres

De­zenas de mi­lhares de ho­mens e mu­lheres con­fluíram, no sá­bado, 2, de todas as partes de Es­panha, para Ma­drid, onde exi­giram a re­ti­rada do pro­jecto que proíbe o aborto.

A luta em Es­panha está a ter eco em toda a UE

 

A grande manifestação partiu da estação ferroviária de Atocha, onde pela manhã chegaram dezenas de composições e autocarros do «Comboio da Liberdade», iniciativa lançada por um grupo de mulheres das Astúrias e à qual aderiram numerosas organizações, partidos políticos e sindicatos nas diferentes regiões.

Ves­tidos de vi­o­leta, os par­ti­ci­pantes no pro­testo apon­taram as suas pa­la­vras de ordem contra o mi­nistro da Jus­tiça, Al­berto Ruiz-Gal­lardón, que se re­clama de autor do an­te­pro­jecto de lei que li­mita a prá­tica do aborto legal aos casos de vi­o­lação ou de grave ameaça para a saúde fí­sica ou psí­quica da mu­lher.

Ao pas­sarem frente ao edi­fício do Mi­nis­tério da Saúde, os ma­ni­fes­tantes gri­taram: «Aborto legal e no hos­pital».

Como su­bli­nhou uma re­pre­sen­tante da maré vi­o­leta de Má­laga, ci­tada pelo pú­blico.es, a re­forma de Gal­lardón «não é re­gressar ao ano de 1985, nem à época de Franco, é re­gressar à Idade Média, onde o Es­tado é dono do corpo da mu­lher e a Igreja pro­pri­e­tária da sua alma». Lola Fer­nández frisou ainda que «lu­tamos para que os abortos se façam em ter­ri­tório es­pa­nhol, não em Lon­dres ou em Paris».

Por isso, notou por seu lado Es­te­fanía Martín Palop, se­cre­tária re­gi­onal da Saúde e Con­sumo do PSOE da An­da­luzia, «não acei­ta­remos ma­qui­lha­gens ou mo­di­fi­ca­ções, acei­ta­remos apenas a re­ti­rada total da re­forma».

Já frente ao Con­gresso dos De­pu­tados, onde ter­minou o des­file, uma de­le­gação com re­pre­sen­tantes das di­versas as­so­ci­a­ções di­rigiu-se ao edi­fício do par­la­mento para en­tregar o do­cu­mento in­ti­tu­lado «Porque eu de­cido», di­ri­gido ao pre­si­dente do go­verno, aos mi­nis­tros da Jus­tiça e Saúde e aos grupos par­la­men­tares res­pon­sá­veis pela tra­mi­tação do an­te­pro­jecto da «Lei Or­gâ­nica de Pro­tecção da Vida do Con­ce­bido e dos Di­reitos da Grá­vida».

O do­cu­mento exige a ma­nu­tenção da ac­tual lei, apro­vada em 2010, que re­co­nhece o di­reito da mu­lher de abortar li­vre­mente até às 14 se­manas.

Um pro­jecto re­tró­grado

As in­ten­ções do go­verno con­ser­vador de Ma­riano Rajoy de­sen­ca­de­aram uma vaga de in­dig­nação em vá­rios países da União Eu­ro­peia, onde, em geral, o pro­jecto é visto como um re­tro­cesso grave nos di­reitos da mu­lher e um ataque à de­mo­cracia.

Em sinal de so­li­da­ri­e­dade com as mu­lheres de Es­panha, ti­veram lugar no mesmo dia ma­ni­fes­ta­ções em vá­rias ca­pi­tais eu­ro­peias. Este mo­vi­mento teve par­ti­cular ex­pressão em França, onde o di­reito à in­ter­rupção vo­lun­tária da gra­videz também está ser a posto em causa por al­guns sec­tores po­lí­ticos. Em res­posta, 80 or­ga­ni­za­ções de mu­lheres re­a­li­zaram mar­chas de pro­testo em 34 ci­dades fran­cesas.

GUE pro­move pe­tição

Em apoio às mu­lheres de Es­panha, os de­pu­tados do Grupo da Es­querda Uni­tária Eu­ro­peia/​Es­querda Verde Nór­dica (GUE/​NGL) lan­çaram uma pe­tição que já foi as­si­nada por 174 eu­ro­de­pu­tados, assim como 77 par­la­men­tares na­ci­o­nais.

Os de­pu­tados do grupo ma­ni­fes­taram a sua so­li­da­ri­e­dade du­rante uma con­fe­rência de im­prensa, re­a­li­zada dia 15, em Es­tras­burgo, a que se se­guiu um pro­testo (ver caixa) contra o ataque do go­verno de Rajoy aos di­reitos se­xuais e re­pro­du­tivos da mu­lher.

Se­gundo afirmou o de­pu­tado es­pa­nhol (Es­querda Unida) Willy Meyer, «o Par­tido Po­pular está a le­gislar cla­ra­mente sob a pressão da hi­e­rar­quia da Igreja Ca­tó­lica, pre­ten­dendo acabar com o di­reito da mu­lher à in­ter­rupção vo­lun­tária da gra­videz». «As mu­lheres tra­ba­lha­doras, de­sem­pre­gadas ou po­bres terão de abortar ile­gal­mente com risco para as suas vidas, e apenas aquelas com re­cursos para vi­ajar o po­derão fazer nou­tros países».

Também o pre­si­dente da Co­missão da Mu­lher do PE, o sueco Mi­kael Gus­tafsson, su­bli­nhou que «com os di­reitos das mu­lheres não se brinca».

«Se esta lei for apro­vada, tal pres­supõe uma vi­o­lação dos di­reitos hu­manos das mu­lheres. As au­to­ri­dades es­pa­nholas estão a se­guir na di­recção er­rada.»


So­li­da­ri­e­dade e pre­o­cu­pação

Na manhã de dia 15 de Ja­neiro, de­pu­tados de grupo po­lí­tico par­ti­ci­param num pro­testo re­a­li­zado no ex­te­rior do he­mi­ciclo em Es­tras­burgo.

Em de­cla­ra­ções re­fe­ridas num co­mu­ni­cado de im­prensa do grupo, a de­pu­tada do PCP, Inês Zuber, ex­pressou a so­li­da­ri­e­dade dos co­mu­nistas por­tu­gueses com as mu­lheres es­pa­nholas, sa­li­en­tando que se as­siste «a um enorme re­tro­cesso em termos de di­reitos eco­nó­micos e so­ciais em Es­panha e dos di­reitos das mu­lheres», e aler­tando que «existe o risco de efeito do­minó sobre ou­tros países». «As mu­lheres da classe tra­ba­lha­dora são as que vão so­frer mais com esta si­tu­ação».




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