Palco Paz

Afirmar a paz através da cultura e da música

Pedro Fernandes

Sexta-feira, sábado e domingo foram três dias preenchidos para os muitos que os passaram na Atalaia. Dezenas de concertos de uma variedade imensa de géneros musicais, espectáculos, cinema, teatro, gastronomia, exposições, debates, luta, camaradagem, solidariedade, fraternidade e alegria – a lista é quase interminável. A Festa do Avante! comprovou, como faz há 46 anos, ser uma experiência única. Disso, a melhor prova foi o sorriso com que os visitantes, no domingo à noite, abandonaram o recinto.

Tudo isto houve de sobra no Palco Paz. Num viçoso relvado, entre o Alentejo e Aveiro, coube um mundo. Na sexta-feira, foram os Maria Silva a estrear o espaço e o público, uns dos finalistas do Concurso de Bandas Novos Valores da JCP. Com uma voz harmoniosa acompanhada por instrumentos populares e outros mais modernos, os jovens foram capazes de dar uma vida nova a temas tradicionais nacionais.

Foram seguidos, de assalto, pel’ O Gang – quatro ribatejanos apaixonados pelo pós punk e pelo rock. «Na confusão em que está este País, nós estamos cá, estamos sempre cá», afirmou um dos membros à plateia durante o espectáculo cantado exclusivamente em português.

A noite terminou a rigor com o Dj Mati@s que, de forma arrojada, agitou o público de forma quase eléctrica. Numa espécie de quase baile mandado, o artista ainda ensinou, a quem assistia, como dançar ao som da música de todo o mundo.

Valu actuou no final da tarde de sábado. Ao som de uma guitarra, num palco coberto de cravos, uma voz feminina interpretou vários músicas de pendor interventivo.

Hadessa, cheia de energia, tomou o público de surpresa com um cruzamento entre a música tradicional, electrónica e outras influências. Com a entrada em cena de Sofia Lisboa, vocalista do grupo que actuaria depois, o espectáculo atingiu um momento alto, só alcançável por quem já partilhou muitas cantigas e intimidade nos mesmos palcos. Seguiu-se o Povo, que, com o muito carinho demonstrado àquele palco, embalou os visitantes da Festa em português, inglês, italiano e francês.

Com os Kiloko, o público não teve hipótese senão aproveitar a viagem por vários pontos do globo. Tal como nos restantes palcos da Festa, este grupo, que resulta da efervescência cultural da capital portuguesa, rematou a noite de sábado com muitos momentos de euforia, mas com outros tantos de serenidade.


Produção e fruição cultural

No domingo, a comprovar a versatilidade e a diversidade de géneros musicais, foi a música filarmónica e de banda que brilhou durante a tarde. Primeiro com o Conservatório de Artes de Loures e depois com a Escola da Banda Juvenil da Orquestra Filarmónica Timbre Seixalense. Para além de entusiasmar o público, mas também quem lá passava perto nas alamedas que sobem e descem desde o Palco 25 de Abril até ao Espaço Internacional ou ainda os que gozavam de vista privilegiada desde o Espaço de Aveiro, estes dois grupos mostraram a importância do acesso à cultura e do movimento associativo para as crianças.

Foi referido, por exemplo, que na banda juvenil seixalense os jovens podem aprender música gratuitamente. Foram interpretadas músicas como Bohemian Rhapsody, dos Queen, o tema composto por Ennio Morricone para o filme The good, the Bad and the Ugly e algumas faixas que compõem a banda sonora do filme Mamma Mia!, que animaram de forma particular quem assistia.

LuizGa ajudou, com alguma calma, a abrir a última noite do Palco Paz. Criado no interior de Minas Gerais, o cantor convidou o público a dar um passo de dança, com temas herdeiros da música popular brasileira e com influência de música de todo o mundo.

Para o concerto derradeiro bastou uma guitarra, bateria, baixo e uma voz que soube expressar a rebeldia a que se propuseram os Hill’s Union desde a sua formação acompanhada do propósito de dar a conhecer a obra do sindicalista e compositor estado-unidense Joe Hill. O grupo mostrou ao que vinha quando tocou o seu único single Fall Now Fascists!, «um hino anti-fascista».


Valorizar a tradição
e ensinar a música

A tradição do cante foi presença forte no Palco Paz, que recebeu o Grupo Coral do Torrão, o Grupo Coral Alma Feminina, ambos de Alcácer do Sal, e o Grupo Coral e Etnográfico Os Camponeses de Pias. Nos três espectáculos, divididos entre o início da tarde de sábado e domingo, a honestidade e a frontalidade da música de quem trabalha fizeram arrepiar. «Queremos que o cante vá mais além e não morra», afirmou um dos pienses no final da actuação, depois de já ter dito que «numa altura de várias guerras» se deveria «valorizar ainda mais a paz»

Ali houve ainda oportunidade de aprender. No sábado, antes do seu próprio concerto, a Orquestra de Foles ensinou sobre os diferentes ritmos e géneros musicais interpretados pela gaita de foles, como a chula ou a carvalhesa, e explicou a história de várias gaitas, como a mirandesa ou a galega. No final, depois de um convite endereçado ao público para experimentar os vários instrumentos, foi a vez do grupo demonstrar o que ensinou com uma actuação que viajou por vários repertórios tradicionais.

«Estão consciencializados? É importante estarmos a par do que se passa no mundo e é importante perceber o que é, realmente, a paz», salientou um dos membros durante o concerto. «Quem aqui está nesta Festa, quer de facto fazer alguma coisa pela cultura. Nem agarrado a uma máquina me tiravam daqui», acrescentou.

No domingo, antes da sua actuação – onde se contaram muitos temas da música tradicional portuguesa –, o grupo feminino Fio à Meada também realizou uma oficina onde o público teve a oportunidade de tocar, cantar e participar num processo musical tradicional.




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