Sem reforço do investimento no SNS os problemas persistem e o direito à saúde está em causa

O PCP re­a­firma que os pro­blemas de acesso aos cui­dados de saúde «não são con­jun­tu­rais ou epi­só­dicos, são antes es­tru­tu­rais e cró­nicos», e alerta que se agravam de dia para dia de­vido à falta de res­postas do Go­verno.

Os pro­blemas não são con­jun­tu­rais, são es­tru­tu­rais

Um dos pro­blemas que me­lhor exem­pli­fica essa au­sência de me­didas ca­pazes de in­verter o agra­va­mento da si­tu­ação na saúde é a «des­va­lo­ri­zação in­ten­ci­onal» de «todos os seus pro­fis­si­o­nais».

«Sim, a des­va­lo­ri­zação dos pro­fis­si­o­nais de saúde é in­ten­ci­onal por fazer parte da “es­pinha dorsal” da es­tra­tégia que os grupos eco­nó­micos têm, com a co­ni­vência dos su­ces­sivos go­vernos, de fazer do sector da saúde um ne­gócio», acusou o de­pu­tado co­mu­nista João Dias, an­te­vendo que as coisas possam vir a agravar-se no ano em curso, a ava­liar pelas me­didas, en­tre­tanto já in­cre­men­tadas ou anun­ci­adas pelo Exe­cu­tivo PS.

Para o par­la­mentar do PCP, que levou o as­sunto ao ple­nário em de­cla­ração po­lí­tica em nome da sua ban­cada, é ilus­tra­tiva das op­ções do Go­verno a de­cisão por este to­mada de re­or­ga­nizar as ur­gên­cias de gi­ne­co­logia e obs­te­trícia e de «equa­ci­onar aplicar o mesmo mo­delo de ro­ta­ti­vi­dade» às ur­gên­cias em geral.

Con­victo de que tal me­dida não au­men­tará a res­posta que é pre­ciso dar para re­duzir os ele­vados tempos de es­pera, antes ser­virá para re­duzir os ser­viços de ur­gência dis­po­ní­veis, João Dias foi ta­xa­tivo na afir­mação de que es­tamos pe­rante so­lu­ções que, além de não re­sol­verem os pro­blemas, os agravam, não indo ao que «está na sua origem», ou seja, a «enorme ca­rência de pro­fis­si­o­nais de saúde, em par­ti­cular de mé­dicos».

Daí que a «prin­cipal so­lução», na óp­tica do PCP, passe por «ga­rantir a con­tra­tação e co­lo­cação de mais pro­fis­si­o­nais de saúde».

Be­ne­fi­ciar os pri­vados

Mas as crí­ticas ao Go­verno não se fi­caram por aqui. Sobre este re­caiu ainda a acu­sação de ter em curso «um ver­da­deiro pro­cesso de en­cer­ra­mento de ser­viços e de con­cen­tração, que não serve de ma­neira ne­nhuma as ne­ces­si­dades da po­pu­lação». E de pouco vale ao Go­verno dizer que as me­didas são tem­po­rá­rias: «o que se vai per­ce­bendo é que de facto têm por de trás um claro ob­jec­tivo de as tornar de­fi­ni­tivas, o que só be­ne­ficia os in­te­resses dos grupos pri­vados», cen­surou João Dias.

Le­van­tada por si foi ainda a questão do anúncio pelo Go­verno de apoios à fi­xação de jo­vens mé­dicos in­ternos, abran­gendo apenas al­gumas das zonas ca­ren­ci­adas do País, e dei­xando de fora ou­tros ter­ri­tó­rios for­te­mente ca­ren­ci­ados, como as re­giões do Tâ­mega e Sousa, de Aveiro, de Lisboa e Vale do Tejo ou do Al­garve.

E não menos grave, se­gundo João Dias, foi o facto de o Go­verno con­ti­nuar a «passar ao lado das ques­tões de fundo»: «os sa­lá­rios e as car­reiras», como, aliás, se com­prova pelo «adi­a­mento das ne­go­ci­a­ções com os sin­di­catos dos mé­dicos», ver­berou.

Por úl­timo, sem a crí­tica do par­la­mentar do PCP não passou a forma como a es­tru­tura de saúde pú­blica tem sido des­va­lo­ri­zada, de­pau­pe­rada de meios, no­me­a­da­mente hu­manos. «Não po­demos aceitar que só se lem­brem da saúde pú­blica quando há uma pan­demia ou um surto de le­gi­o­nela», su­bli­nhou.


Car­reira de en­fer­magem

A apli­cação das re­gras de des­con­ge­la­mento da car­reira de en­fer­magem foi outra ma­téria abor­dada por João Dias. «Há im­pa­ri­dades e in­jus­tiças que urge re­solver», de­nun­ciou, dando como exemplo a si­tu­ação dos en­fer­meiros, pro­mo­vidos à ca­te­goria de es­pe­ci­a­lista por con­curso, mas que viram «anu­lados os pontos an­te­ri­ores à tran­sição para a car­reira, ao passo que os en­fer­meiros que tran­si­taram au­to­ma­ti­ca­mente ao abrigo do D.L. n.º 80-B/​2022 de 28 de No­vembro, vêem acau­te­lada a re­le­vância das ava­li­a­ções de de­sem­penho an­te­ri­ores a essa al­te­ração», isto é, são-lhes con­tados todos os pontos.

Se­gundo o de­pu­tado do PCP, im­porta ainda «res­ponder às po­si­ções vir­tuais igual­mente re­sul­tantes das re­gras de des­con­ge­la­mento da car­reira de en­fer­magem que estão a im­pedir a justa pro­gressão da car­reira».

Fa­lando dos pro­fis­si­o­nais de que o SNS está ca­ren­ciado, além de mé­dicos e en­fer­meiros, João Dias con­si­derou ser pre­ciso su­prir também a falta, entre ou­tros, de téc­nicos su­pe­ri­ores de di­ag­nós­tico e te­ra­pêu­tica, de as­sis­tentes ope­ra­ci­o­nais e de as­sis­tentes téc­nicos.


O ca­minho por fazer

Na de­cla­ração po­lí­tica que pro­feriu, o de­pu­tado João Dias não se li­mitou a iden­ti­ficar o que está mal e a culpar aos seus res­pon­sá­veis. Afirmou também de forma clara o que é pre­ciso fazer para re­solver os graves pro­blemas que com­pro­metem a qua­li­dade dos ser­viços pres­tados, quando não mesmo o pró­prio acesso aos cui­dados de saúde a que os por­tu­gueses têm di­reito.

E a me­dida pri­o­ri­tária é mesmo o re­forço do in­ves­ti­mento no SNS. Só assim, frisou, «será pos­sível acabar com o ele­vado nú­mero de utentes sem mé­dico de fa­mília, com os ele­vados tempos de es­pera para con­sultas, ci­rur­gias, tra­ta­mentos e exames.

Mais, con­cluiu, é a única forma de «pôr fim à in­digna des­va­lo­ri­zação dos pro­fis­si­o­nais de saúde e aos equi­pa­mentos ob­so­letos e à de­gra­dação ou de­sa­de­quação das ins­ta­la­ções».


SNS é con­quista do povo

A de­pu­tada do PS Berta Nunes, ques­ti­o­nando João Dias, in­ter­rogou-se «como é que o PCP pode dizer que o PS quer des­truir o SNS quando foi o PS que criou o SNS». Mos­trou-se ainda per­plexa com a acu­sação de que se está «numa via de não va­lo­rizar os pro­fis­si­o­nais, de não va­lo­rizar o ser­viço de saúde, de di­mi­nuir o acesso».

A res­posta veio pronta, com João Dias a pôr os pontos nos is: «o Ser­viço Na­ci­onal de saúde é uma con­quista da Re­vo­lução de Abril, uma con­quista do povo por­tu­guês». Não deixou ainda de ob­servar que se o PS se con­si­dera pai do SNS, então está a «tratar muito mal o filho».

E deu um exemplo a este pro­pó­sito: no go­verno PS que teve Cor­reia de Campos como mi­nistro da Saúde en­cer­raram quase 20 ma­ter­ni­dades, o que re­pre­sentou «uma perda no acesso ao SNS, no­me­a­da­mente no di­reito à ma­ter­ni­dade».

 



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