O «direito a poluir» que põe os povos a pagar

João Pimenta Lopes

O «Pacote 55» da União Europeia é um pacote legislativo que, a pretexto da redução de emissões de gases de efeito de estufa (GEE) para a atmosfera, aprofunda o processo de mercantilização da Natureza e de liberalização de diversos setores de actividade económica, como o sector energético. Parte importante deste pacote diz respeito ao comércio de licenças de emissão de GEE – o também chamado «mercado do carbono».

O proclamado objectivo deste mercado é a redução das emissões de GEE nos países da UE. Sucede que, para lá da ausência de evidências claras de que tal mecanismo tenha vindo a contribuir até aqui para a redução das emissões, de uma forma de simples compreensão, o que se trata é de consagrar um «direito a poluir» e que se garanta que acede a esse direito quem o possa pagar.

A reformulação do «mercado do carbono», discutida e votada no Parlamento Europeu, prevê o alargamento do comércio de emissões a novos sectores, além dos industriais – como os edifícios, a aviação ou os transportes marítimos e rodoviários. Algo que se articula com – e que não deixará de contribuir para – dinâmicas de concentração monopolista em vários destes sectores, no plano nacional e no plano da UE, de que beneficiarão as principais potências. Por essa via, contribuirá também para o agravamento de desigualdades e assimetrias e para comprometer ou criar maiores dificuldades à pequena e média produção ou a sectores produtivos em países como Portugal. Por outro lado, não é menos certo que caberá aos trabalhadores e aos povos pagarem a fatura da insistência nesta abordagem de mercado à problemática das alterações climáticas. Isto é de tal forma evidente que a própria Comissão Europeia o reconhece, tendo avançado com a proposta de criação do «Fundo Social para a Acção Climática» – já aqui tratado anteriormente – que, capitalizado com verbas resultantes do funcionamento do comércio de emissões, servirá supostamente para mitigar esses impactos nas famílias mais frágeis. Este Fundo, agora aprovado, justificou a denúncia e a crítica dos deputados do PCP no Parlamento Europeu, por penalizar singularmente Portugal na sua chave de alocação por países.

Rejeitamos este caminho. Opomos-lhe uma alternativa, necessária e consequente, de natureza normativa, com objectivos de redução definidos de acordo com critérios justos, que integrem o princípio da responsabilidade comum mas diferenciada, que prevejam a implementação das melhores tecnologias disponíveis e os meios para tal ao nível do orçamento da UE. Uma abordagem que não é contraditória com – antes pressupõe – a valorização da produção nacional e a mudança de políticas em sectores como a energia ou transportes, nomeadamente recuperando o controlo público destes sectores estratégicos.




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