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Segredos para consumo público

ACTUAL • Anabela Fino

A notícia apareceu no Washington Post de domingo: no início do ano, o presidente dos EUA, George W. Bush, deu ordens à CIA para elaborar um plano para derrubar Saddam Hussein. A avaliar pela abundância de pormenores revelados pelo Post sobre uma matéria supostamente secreta, é de admitir que nos últimos meses a CIA tenha aviado o grosso da sua encomenda, teoricamente falando, e que é chegada a hora de preparar o terreno para a acção.

Diz-nos o presumivelmente bem informado Post que Bush autorizou os seus serviços secretos a utilizarem os seguintes métodos: «Aumento do apoio a grupos de oposição iraquianos e a forças dentro e fora do Iraque, incluindo dinheiro, armas, equipamento, treino e informações; aumento dos esforços para recolha de informações no governo, instituições militares, serviços de segurança e população iraquianos, onde foram detectadas bolsas de sentimentos intensos anti-Saddam; possível utilização de equipas da CIA e das Forças Especiais, semelhantes às que foram utilizadas com sucesso no Afeganistão depois dos ataques de 11 de Setembro. Essas forças estariam autorizadas a matar Hussein em legítima defesa».

A maior dificuldade para o sucesso da acção, segundo os especialistas do costume que bebem directamente na fonte as suas informações, parece residir no facto de a CIA se considerar incapaz para se desembrulhar sozinha da missão, enquanto o Pentágono afirma precisar de 200 mil a 250 mil homens para invadir o Iraque.

Tudo isto apareceu em letra de imprensa, preto no branco, sem que pelos vistos os especialistas do costume tivessem considerado necessário tecer qualquer comentário sobre o assunto.

Bush determinou e mandou publicar, logo publicou-se, para ir preparando a opinião pública para a próxima tempestade no deserto.

Bush decretou que quem não for a favor dos EUA é contra os EUA, logo os comentadores encartados meteram a crítica no saco e os governantes da maioria dos países passaram a achar que o silêncio é de ouro.

Invadir um país e matar civis para derrubar um governo tornou-se uma coisa normal quando decidida pelos EUA. Tão normal como mandar matar um presidente que deixou de servir os interesses norte-americanos, custe isso o que custar em termos materiais e humanos.

A indignação, a revolta, a ira que uma tal política legitimamente suscita nos povos do mundo não tem espaço nos jornais nem tempo de antena nas rádios e televisões. O silêncio é tamanho que se torna ensurdecedor. E chama-se a isto democracia!

«Avante!» Nº 1490 - 20.Junho.2002