Intervenção de Jerónimo de Sousa no encerramento

«Por aqui perpassou a confiança»

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Eis-nos chegados ao limiar do encerramento do XIX Congresso.

Para aqui chegar tivemos de percorrer, desde Fevereiro, um processo que envolveu largos milhares de militantes e amigos do Partido, que mobilizou todas as organizações partidárias, de Norte a Sul do Continente, das regiões autónomas dos Açores e da Madeira e na emigração, num total de 1257 reuniões, debates e assembleias electivas, onde participaram mais de 18 mil militantes, contando com as contribuições individuais de camaradas que recorreram à tribuna aberta do Avante! e à via electrónica. Resultaram cerca de 1900 propostas, sugestões e reflexões para o Projecto de Resolução Política e mais de 600 em relação ao Programa do Partido, muitas delas acolhidas nos respectivos projectos. Feita a discussão, realizadas as votações da Resolução Política, das alterações ao Programa e aos Estatutos, e a eleição da Direcção e do órgão de jurisdição, este congresso construiu e afinou as ferramentas, tem os obreiros – os militantes, as organizações e a direcção do Partido.

Importa agora prosseguir a edificação da obra: reforçar o Partido, alargar e intensificar a luta, afirmar a necessidade e a possibilidade da política alternativa patriótica e de esquerda, cimentar e construir uma alternativa política capaz de a concretizar. Aqui actualizámos e reafirmámos o nosso inquebrantável compromisso com os trabalhadores e o povo português, de com eles lutar por um Portugal com futuro, democrático e de progresso, por uma pátria livre e soberana.

Aqui declarámos e inscrevemos que, na luta por uma democracia avançada, os valores do Abril, no que foram de conquista, liberdade, transformação, realização, participação e revolução, nem que fossem (e nós faremos para que não sejam) destruídos, serão sempre parte integrante do nosso ideal comunista e do nosso projecto de construção do socialismo.

Permitam-me duas observações relativas ao funcionamento e aos conteúdos do nosso Congresso.

Os delegados ao XIX Congresso, com a sua presença permanente, dignificaram e assumiram por inteiro o mandato que lhes foi atribuído. E não foi um acto forçado por disciplina. Foi um acto de consciência, livre e responsável, de respeito por quem os mandatou. Não menos relevante foi a presença de convidados. Também este congresso, o seu funcionamento e participação demonstraram que os partidos não são todos iguais.

Sobre as intervenções, não tivemos aqui o desfile de palavras a pensar num tempinho de glória de surgimento na televisão. Não tivemos a moção do chefe, do candidato a chefe, do candidato a candidato a qualquer coisa, porque não há chefe e porque a moção e a resolução são do Partido e resultam da opinião e contribuição colectivas. Foram intervenções ligadas à vida, conhecedoras da realidade nas empresas e nos locais de trabalho, nos sectores que vieram falar dos problemas e das aspirações dos trabalhadores, dos agricultores e pequenos empresários, da juventude, dos intelectuais, dos reformados e pensionistas, dos lutadores que vieram falar da luta, dos especialistas, dos homens e mulheres de saberes, da experiência própria, que vieram falar da política económica, da Saúde, da Educação, da Segurança Social, da água pública, do valor do trabalho, da Cultura e da produção nacional. A pensar no País, todos tendo como fio condutor o reforço do Partido, da sua organização, da sua influência social, política e eleitoral.

Sim, é verdade que não haverá eco nos meios de comunicação social dominante. Mas posso afiançar-vos que a riqueza da análise, as experiências criativas de reforço do Partido, da proposta, para além da sua tradução e expressão nos documentos, serão parte integrante do nosso património de ideias, análise e propostas do Partido, e elementos para acerto da orientação, acção e iniciativa.

Falámos de nós, da nossa vida partidária, mas nem aí estabelecemos fronteiras com os problemas dos trabalhadores e do povo e da sociedade. Foi um congresso virado para fora.

Aqui afirmámos o nosso combate mais imediato e urgente e contra esta política de desastre nacional e o seu executor, o Governo PSD/CDS-PP.

Partindo da realidade nacional, do aumento da exploração dos trabalhadores, da pobreza, das injustiças, do desemprego, da ruína de pequenos agricultores, comerciantes e industriais, do défice, da dívida insuportável, da destruição das funções sociais do Estado, de alienação da nossa soberania nacional, responsabilizando a política de direita, considerámos que o chamado memorando das troikas (que caracterizámos, e bem, como um verdadeiro pacto de agressão) deve ser rejeitado, que é necessária uma ruptura e uma mudança de política.

Não nos limitámos à crítica, à luta contra. Temos uma proposta política alternativa que, numa síntese das sínteses, propõe:

1.º - Resgatar Portugal da teia de submissão e dependência;

2.º - Recuperar para o País o que é do País: os seus recursos, os seus sectores e empresas estratégicas, o seu direito ao crescimento económico e ao desenvolvimento e à criação de emprego;

3.º - Devolver aos trabalhadores e ao povo os seus salários, rendimentos e direitos sociais, tendo com objectivo uma vida digna. Um povo com direito à Saúde. Um povo com direito à Educação. Um povo com protecção social.

Convergência e alternativa

É necessária e urgente uma outra política e um outro Governo. E esse é o primeiro apelo deste congresso: a todos os trabalhadores, a todas as classes e camadas antimonopolistas, a todas as forças políticas patrióticas e de esquerda, a todos os democratas, a todos os cidadãos inquietos e indignados com este rumo de desastre nacional, para que converjam no objectivo de pôr fim a esta política.

Este Governo já não tem a base social de apoio que tinha há um ano e meio. Terá legalidade, mas já não tem legitimidade para prosseguir a sua obra destrutiva, porque mentiu, rompeu o compromisso que estabeleceu com muitos dos seus votantes; porque está a tornar num inferno a vida de milhões de portugueses desempregados, empobrecidos, arruinados; porque a sua opção é servir apenas os poderosos, o capital financeiro e os grandes grupos económicos, custe o que custar.

É um Governo que já é passado. Demore o tempo que demorar, não tem futuro e será derrotado. E quanto mais depressa for demitido mais se reforça a esperança que ainda estamos a tempo de travar e inverter este caminho.

Daqui releva uma questão crucial, que é a construção de uma verdadeira alternativa e como é que ela se concretiza.

A nossa Resolução Política define orientações e tem um rumo: a necessidade do reforço do PCP e a alteração da relação de forças, no plano político, o desenvolvimento, a intensificação e alargamento da luta.

Tratando-se de uma alternativa patriótica e de esquerda, a encontrar no plano institucional, há uma questão primeira que é incontornável. É saber se uma força política como o PCP, que de forma coerente e consequente defende valores, causas e um projecto de esquerda, deveria abdicar deles, e se o PS, comprometido com a política de direita, com os interesses do capital, comprometido e «abaixo-assinante» do pacto de agressão, assim se deveria manter, tal como está. O PS não dá resposta à contradição fundamental que é a de saber se é possível uma alternativa verdadeiramente de esquerda, mantendo-se comprometido e identificado com a política de direita em questões estruturantes.

Nós dissemos e dizemos que não renunciamos à convergência e ao diálogo com forças e sectores democráticos, em tudo o que for bom para os trabalhadores, para o povo e para o País. Mas ninguém peça ou exija ao PCP que deixe de ser o que é, que deixe de falar verdade, que deixe de lutar por outra política, que rompa com esta estafada alternância. Este Partido fundou-se e existe, lutou e luta, para servir os trabalhadores e o povo português, os seus interesses e aspirações. Será pela sua vontade e apoio que estaremos numa solução alternativa. E não por arranjos de poder que nos exijam deixar de ser o que somos, deixar de defender o que defendemos.

Fartos de serem enganados e de troca-tintas estão os portugueses.

No apelo que fazemos, a que se juntem a nós na luta, também no voto damos garantia. Esse apoio, essa luta, esses votos não serão traídos. Serão sempre respeitados.

Aqui estamos prontos para as tarefas e batalhas que aí estão e aí vêm. Munidos das nossas propostas. Assumindo que os comunistas estarão na linha da frente da luta em defesa dos direitos dos trabalhadores, da juventude, das mulheres, dos reformados e pensionistas, de todas as classes e camadas antimonopolistas.

Aqui estamos, sem dar tréguas a esta política e a este Governo que, fugindo para a frente, se prepara para aplicar um novo e rude golpe nas funções sociais do Estado, na democracia, na Constituição.

Daqui partimos em melhores condições para travar qualquer batalha eleitoral e, particularmente, as eleições autárquicas – a exigir um forte empenhamento do conjunto das organizações do Partido, para, lado a lado com os nossos parceiros de coligação, o Partido Ecologista «Os Verdes» e a Intervenção Democrática, lado a lado com milhares de cidadãos e democratas independentes, afirmar a CDU e o PCP como grande força autárquica, com grande peso e influência, correspondentes ao valor do seu trabalho e do seu prestígio conquistado pela obra, pela honestidade e competência.

Daqui saímos com a afirmação confiante de que o povo e o País não estão condenados por qualquer cataclismo, praga natural, má sorte ou fatalidade. Praga é a política de direita, e essa pode ser erradicada por força da luta do trabalhadores e do povo.

Internacionalismo

Reafirmámos o nosso carácter patriótico e internacionalista. A centralidade que damos à luta no campo nacional não é por qualquer concepção isolacionista e porque não entendamos da necessidade de respostas mais largas e mais globais a um processo de globalização capitalista.

Pensamos que a melhor contribuição para o desenvolvimento da solidariedade e cooperação internacionalistas, a melhor e mais realizadora forma para fazer frente à ofensiva imperialista é lutar aqui, no nosso País. Tal facto não subestima nem significa menos empenhamento na luta contra o capitalismo e o imperialismo. Naturalmente, priorizamos os nossos esforços no reforço do movimento comunista internacional. Com a agudização da luta de classes, os partidos comunistas são mais precisos do que nunca, na medida em que essa luta de classe é a grande questão da nossa época contemporânea.

Mas reafirmámos aqui a nossa admiração e a dimensão solidária com os povos e a luta dos trabalhadores, as heróicas afirmações da luta dos povos frente ao imperialismo, em defesa da sua soberania, desse direito inalienável de poderem traçar e construir o seu devir colectivo.

Reafirmámos aqui a nossa solidariedade ao povo e à revolução cubana, ao povo mártir da Palestina, aos partidos e movimentos de libertação, aos milhões de seres humanos que, à escala planetária, demonstram uma vontade inabalável de construção do mundo mais justo, mais seguro e democrático e a profunda convicção de que o capitalismo não será o fim da história da humanidade, que há alternativa: o socialismo.

A todas as delegações e representações internacionais, uma saudação solidária dos comunistas portugueses aos vossos partidos e organizações, aos vossos povos, e digam-lhes que, nas horas boas e nas horas más, nas vitórias e nas derrotas, aqui em Portugal contam com esta força solidária, este Partido Comunista Português.

Sim, é possível!

Temos orientações, tomámos deliberações, afirmámos um Partido de luta, de proposta, de projecto.

Aprovámos alterações ao Programa do Partido. Alterações e actualizações que não alteram a matriz do nosso Programa, de uma democracia avançada como etapa, sem perder de vista o objectivo supremo do socialismo e do comunismo.

Este congresso confirma a decisão de realizarmos, no ano de 2013, as comemorações do centenário do nascimento de Álvaro Cunhal, de homenagem ao homem, ao comunista, ao intelectual, ao artista que, com o seu pensamento e acção política, com a sua história pessoal de combate pela liberdade, a democracia e o socialismo, é uma referência incontornável para os comunistas mas também para todos os que se inquietam com os problemas da sociedade, a regressão social e civilizacional.

Lembramos e honramos a nossa história. Mas projectamos nessas comemorações os seus ensinamentos, a sua obra, o seu exemplo a pensar no futuro.

Por aqui perpassou a confiança.

Numa situação dura como punhos, quando os trabalhadores, o povo português e o País sofrem o vendaval destrutivo e arrasador da política de direita deste Governo, nós afirmamos: Nada está perdido para todo o sempre.

Quando os trabalhadores e as populações intensificaram e alargaram a luta, o Governo abanou. Se essa luta crescer, o Governo será derrotado. E contem com este Partido que, com ou sem eleições, nos momentos mais difíceis, lá estará, sempre e sempre como força de combate, como força portadora da esperança e da alternativa, com a convicção de que, sim, é possível uma vida melhor num Portugal com futuro.



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