PCP põe os pontos nos is sobre os limites de mandatos

Ser autarca não é cadastro

Os pre­si­dentes de Câ­mara Mu­ni­cipal ou Junta de Fre­guesia com três man­datos con­se­cu­tivos não podem re­can­di­datar-se a um quarto man­dato mas podem can­di­datar-se a um pri­meiro man­dato em outra au­tar­quia.

Mi­lhares de au­tarcas servem de forma de­sin­te­res­sada a causa pú­blica

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Essa é a firme con­vicção do PCP, ali­cer­çada numa razão sin­gela e óbvia: «é que não há nada na lei que o proíba e não há in­ter­pre­tação da lei con­forme à Cons­ti­tuição que o im­peça».

O de­pu­tado co­mu­nista An­tónio Fi­lipe não podia ser assim mais claro ao de­finir a po­sição da sua ban­cada sobre a lei que es­ta­be­lece li­mites à re­no­vação su­ces­siva de man­datos de quem está à frente de au­tar­quias.

Cla­ri­fi­cação opor­tuna e da maior im­por­tância face a uma lei cuja in­ter­pre­tação, como foi dito, tem dado lugar à es­pe­cu­lação, bem como a «ten­ta­tivas de lançar a con­fusão em torno das can­di­da­turas às pró­ximas elei­ções para as au­tar­quias lo­cais».

Por isso a ban­cada co­mu­nista levou o as­sunto ao ple­nário da AR, faz hoje oito dias, em de­cla­ração po­lí­tica onde de­mons­trou a ine­xis­tência de ra­zões ju­rí­dicas (ainda que ad­mita, em­bora dis­corde, que possam ser in­vo­cadas ra­zões po­lí­ticas) para que «um ci­dadão que tenha exer­cido um cargo po­lí­tico por um de­ter­mi­nado pe­ríodo seja pri­vado de di­reitos po­lí­ticos».

É a Cons­ti­tuição, su­bli­nhou An­tónio Fi­lipe, que dispõe que «todos os ci­da­dãos têm o di­reito de tomar parte na vida po­lí­tica e na di­recção dos as­suntos pú­blicos do País» (ar­tigo 48.º) e que «todos os ci­da­dãos têm o di­reito de acesso, em con­di­ções de igual­dade e li­ber­dade, aos cargos pú­blicos» (ar­tigo 50.º).

E se é certo que a lei pode es­ta­be­lecer li­mites a estes di­reitos – e é o que faz em di­versos casos através de «ine­le­gi­bi­li­dades des­ti­nadas a ga­rantir a li­ber­dade de es­colha dos elei­tores e a isenção e in­de­pen­dência do exer­cício dos res­pec­tivos cargos» –, essa li­mi­tação, no caso dos man­datos au­tár­quicos, de­corre de «ex­pressa au­to­ri­zação cons­ti­tu­ci­onal».

«As leis res­tri­tivas de di­reitos fun­da­men­tais, como é o caso, devem ser in­ter­pre­tadas res­tri­ti­va­mente e não podem ter uma in­ter­pre­tação ex­ten­siva. Não somos nós que o di­zemos, é a Cons­ti­tuição que o de­ter­mina», sa­li­entou o de­pu­tado do PCP.

 

O man­dato

 

E o que a lei diz, es­cla­receu, é que «o pre­si­dente da Câ­mara Mu­ni­cipal e o pre­si­dente de Junta de Fre­guesia só podem ser eleitos para três man­datos con­se­cu­tivos». Posto isto, pros­se­guiu, trata-se de de­finir «o que é um man­dato». «Nós temos em Por­tugal um man­dato de pre­si­dente de Câ­mara a ser exer­cido por 308 ti­tu­lares ou temos 308 man­datos a ser exer­cidos por ti­tu­lares di­fe­rentes? O pre­si­dente da Câ­mara Mu­ni­cipal de Coimbra e o pre­si­dente da Câ­mara Mu­ni­cipal de Bar­rancos exercem o mesmo man­dato? Ob­vi­a­mente que não. Cada ti­tular de cargo po­lí­tico exerce o man­dato para que foi eleito. Não exerce os man­datos dos ou­tros. E a li­mi­tação de man­datos que in­cida sobre cada um só pode in­cidir sobre os seus pró­prios man­datos e não evi­den­te­mente sobre os man­datos dos ou­tros».

A tese de al­guns fa­ze­dores de opi­nião se­gundo a qual quem tenha exer­cido três man­datos con­se­cu­tivos fica proi­bido de se can­di­datar a outra au­tar­quia porque foi esse o «es­pí­rito do le­gis­lador» foi também re­fu­tada ener­gi­ca­mente por An­tónio Fi­lipe (ver caixa). «Isso não cor­res­ponde à ver­dade», frisou, de­sa­fi­ando à lei­tura dos de­bates então re­a­li­zados sobre a lei em vigor para atestar que nin­guém daí «con­segue ex­trair em lado algum essa con­clusão mas antes a con­trária».

 

Não à sus­peição

 

O par­la­mentar co­mu­nista e vice-pre­si­dente da AR afirmou, por fim, não ter dú­vidas, ju­ri­di­ca­mente, de que os ci­da­dãos com três man­datos con­se­cu­tivos à frente de au­tar­quias não podem re­can­di­datar-se na­quelas onde exer­ceram fun­ções mas não estão le­gal­mente im­pe­didos de se can­di­datar em qual­quer outra au­tar­quia.

«Ser au­tarca não é ca­dastro. Um ci­dadão não pode ser pri­vado in­jus­ta­mente dos seus di­reitos po­lí­ticos pelo facto de ter sido au­tarca du­rante 12 anos, e a li­mi­tação de man­datos que está es­ta­be­le­cida na lei não pode ser en­ten­dida como uma pu­nição de quem pre­sidiu a exe­cu­tivos au­tár­quicos», alegou, antes de con­cluir que o PCP «bate-se pelo rigor, pela ho­nes­ti­dade e pela com­pe­tência» e de­fende «todas as me­didas que pre­vinam quais­quer fe­nó­menos de abuso de poder, cor­rupção ou cli­en­te­lismo», mas não acom­panha «aqueles que pro­curam trans­mitir a ideia de que tais fe­nó­menos de­correm ine­vi­ta­vel­mente do exer­cício de fun­ções au­tár­quicas, como se não hou­vesse mi­lhares de ci­da­dãos que, como au­tarcas, servem de­sin­te­res­sa­da­mente a causa pú­blica e que não me­recem ser alvo de um per­ma­nente juízo de sus­peição».

 

Si­lên­cios e equí­vocos

An­tónio Fi­lipe con­gra­tulou-se por a ban­cada do PSD não se ter re­me­tido ao si­lêncio no de­bate, como fez o PS e o CDS-PP. E va­lo­rizou a ati­tude so­bre­tudo agora que se apro­xima o pro­cesso elei­toral au­tár­quico, quando há quem es­teja apos­tado em con­fundir e até in­sinue que esta é uma questão que se pode ar­rastar pra­ti­ca­mente até às elei­ções, co­lo­cando a in­cer­teza sobre a le­ga­li­dade de can­di­da­turas.

E por isso su­bli­nhou a im­por­tância de serem as­su­midas po­si­ções claras sobre esta ma­téria, por­quanto, como bem disse o de­pu­tado do PSD José de Matos Cor­reia, há quem tenha «opi­niões en­vi­e­sadas, sa­bendo que mente» e há «pes­soas que não sa­bendo aquilo que dizem o dizem mesmo quando ti­nham a obri­gação de o saber».

Pa­tente no de­bate ficou en­tre­tanto a dis­cor­dância clara da ban­cada co­mu­nista quanto à po­sição do BE. Res­pon­dendo ao de­pu­tado Luís fa­zenda, que fa­lara do prin­cípio cons­ti­tu­ci­onal da não re­no­vação de man­datos, An­tónio Fi­lipe es­cla­receu que «o prin­cípio da não re­no­vação de man­datos não é um prin­cípio geral da nossa Cons­ti­tuição; é uma ex­cepção que es­ta­be­lece em de­ter­mi­nados casos». E pre­cisou que a Cons­ti­tuição o que es­ta­be­lece é que «não pode haver cargos vi­ta­lí­cios».

Lem­brou, por outro lado, que a lei Fun­da­mental es­ta­be­leceu desde início uma ex­cepção ao prin­cípio da re­no­vação de man­datos no caso do Pre­si­dente da Re­pú­blica, tendo em conta as ca­rac­te­rís­ticas desse órgão, para en­fa­tizar a forma re­pu­bli­cana de poder».

E que só muito mais tarde a lei em vigor es­ta­be­leceu o mesmo re­la­ti­va­mente aos ti­tu­lares de ór­gãos exe­cu­tivos das au­tar­quias.

É certo que o BE de­fendia a apli­cação deste prin­cípio a ou­tros cargos e que isso não foi aceite. Mas o que es­teve agora em dis­cussão, como as­si­nalou An­tónio Fi­lipe, não é o que cada um pen­sava na al­tura mas sim o que está hoje na lei. «E o que está na lei não ad­mite que haja uma in­ter­pre­tação ex­ten­siva, que se queira ver na lei aquilo que ela ma­ni­fes­ta­mente não contém», afirmou, ta­xa­tivo.

E também «o es­pí­rito do le­gis­lador» não vai no sen­tido que re­feriu Luís fa­zenda. Isto porque no de­bate então re­a­li­zado a única re­fe­rência a esta ma­téria foi exac­ta­mente em sen­tido con­trário ao que o BE de­fende, re­cordou o de­pu­tado do PCP. Ou seja, a pro­posta de lei que es­tava em dis­cussão não im­pedia que um au­tarca de­pois de exercer três man­datos con­se­cu­tivos numa au­tar­quia pu­desse can­di­datar-se numa outra.

 



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