Jornadas Parlamentares do PCP com soluções para os problemas do País
Entrará no Parlamento em Maio um diploma do PCP «tripartido» dirigido para a libertação da submissão ao euro, a renegociação da dívida e o controlo público da banca.
Urge uma política que defenda e modernize o aparelho produtivo
O PCP decidiu ainda nas suas Jornadas Parlamentares realizadas esta segunda-feira e terça-feira, 10 e 11, em Coimbra, agendar uma interpelação ao Governo centrada nas condições para o desenvolvimento da produção nacional.
Estes são dois exemplos concretos de resposta a problemas estruturais que o Partido considera serem hoje factores de bloqueio ao desenvolvimento nacional.
Foi, aliás, sob o signo da busca de soluções para esses problemas que persistem na sociedade portuguesa que o PCP realizou estas Jornadas, onde pontificaram outros assuntos fortes (quer em termos de análise quer de proposta) como sejam a reposição e conquista de direitos, contratação colectiva, criação das regiões administrativas, apoio à produção e às MPME, redução da factura energética, regime fundacional do Ensino Superior, degradação do sistema prisional, para além de áreas específicas mais relacionadas com a realidade regional como é o caso da obra hidroagrícola do Baixo Mondego.
Produção, emprego, soberania, libertação de Portugal dos constrangimentos que o põem a marcar passo, deram assim corpo ao tema destes dois dias de intenso trabalho em que os deputados comunistas se desdobraram em visitas e contactos com os mais variados sectores e entidades.
Dos encontros resultou um conhecimento mais minucioso e informado sobre a realidade do distrito que, independentemente de aspectos mais específicos, pouco difere afinal daqueles que são os traços fundamentais que caracterizam hoje em termos económicos, sociais e políticos o quadro nacional, como puderam constatar os deputados comunistas na análise que fizeram e nos contactos estabelecidos num preenchido programa com mais de dezena e meia de visitas e reuniões em vários concelhos do distrito de Coimbra.
O grande défice
Como salientou na sessão de abertura o Secretário-geral do PCP, «não é o défice das contas públicas o grande problema do País». «É um problema, mas não é o problema», sublinhou Jerónimo de Sousa, esclarecendo que para o PCP o «principal défice» do País é o da produção e é dele que resultam «todos os outros, juntamente com o grave problema da elevada dívida».
João Oliveira, logo a abrir a sessão inaugural das Jornadas com sala cheia numa unidade hoteleira de Coimbra, chamara já a atenção para a circunstância de os «impactos e consequências» dos constrangimentos a que o País está sujeito não estarem «desligados» dos problemas concretos sentidos pelos trabalhadores e pelo povo. Pelo contrário, frisou, têm uma incidência directa no quotidiano das pessoas, «são problemas da vida de todos os dias, em todas as área se sectores».
Há muito identificados de forma clara pelo PCP, foram esses constrangimentos que uma vez mais estiveram em primeiro plano nas Jornadas – o euro, a dívida, o domínio do capital monopolista –, com o Grupo Parlamentar comunista a sublinhar a necessidade imperiosa de proceder a uma ruptura que os elimine e, dessa forma, liberte Portugal dos garrotes que lhe tolhem o desenvolvimento, o progresso e a justiça social.
É que o euro, como foi dito, tem «regras e critérios» que nos prejudicam para servir os interesses de países mais poderosos e que nos amarram a «decisões e imposições externas».
«[O euro] Representou para Portugal estagnação e recessão, desinvestimento e degradação do aparelho produtivo, endividamento acentuado, privatização de empresas estratégicas, perda de competitividade, degradação dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, aumento do desemprego e da precariedade, redução dos salários e aumento da exploração, agravamento das desigualdades sociais e da pobreza», sublinhou João Oliveira ao apresentar em conferência de imprensa, na tarde desta terça-feira, as conclusões das Jornadas.
Dívida impagável
«Todos compreendemos bem a falta que nos fazem os oito mil milhões de euros que gastamos com os juros da dívida quando nos dizem depois que não há dinheiro para apoiar a produção nacional e os sectores produtivos, para modernizar a ferrovia, para investir na ciência e na investigação, para melhorar condições de trabalho e de vida, para alargar o acesso e melhorar a qualidade da educação ou dos serviços de saúde», comentou João Oliveira, abordando na abertura dos trabalhos a questão da dívida e do seu nível «insustentável e impagável», com juros cujo peso no OE, como o PCP não se tem cansado de afirmar, equivale hoje ao orçamento da saúde e mais do que o da educação.
Falar desse outro constrangimento que é o domínio do capital monopolista sobre os sectores estratégicos, por seu lado, é falar da sangria anual para o estrangeiro de milhares de milhões de euros em lucros e dividendos, bem como da retirada ao País do «controlo sobre alavancas fundamentais para o seu desenvolvimento, em especial na banca». Daí João Oliveira ter considerado ainda na sua intervenção no arranque dos trabalhos não ser difícil perceber as «consequências do domínio do capital monopolista sobre os sectores estratégicos sempre que um banco privado, utilizando ou não off-shores, põe milhares de milhões de euros no estrangeiro depois de ter extorquido os clientes particulares com comissões bancárias ou cobrado juros usurários às pequenas e médias empresas».
Por isso o controlo público da banca, «tomando as formas ajustadas a cada instituição e a cada momento», como se pode ler no documento de conclusões das Jornadas, é uma «condição para a libertação de recursos de que o País carece e para a própria estabilidade do sistema financeiro nacional, retirando o centro da sua actividade da especulação e colocando-o no apoio à economia, às micro, pequenas e médias empresas e às famílias».
Para os deputados comunistas é assim evidente, em síntese, que não é possível o desenvolvimento económico e social sem a renegociação da dívida, a libertação da submissão ao euro e o controlo público da banca. Pela razão simples, sustentam, de que são instrumentos «fundamentais para o investimento na produção nacional, nos sectores produtivos, na reindustrialização e no apoio às micro, pequenas e médias empresas; na criação de emprego e na valorização dos trabalhadores e dos salários; na defesa dos direitos laborais e sociais e na recuperação da nossa soberania».
Apoio às MPME
A merecer uma particular atenção no decurso das Jornadas esteve ainda o apoio às micro, pequenas e médias empresas, visto pelo PCP como um «elemento indispensável na resposta aos graves problemas económicos nacionais». Várias propostas suas de grande importância têm vindo de resto a ser aprovadas, sendo disso exemplo as relacionadas com a redução dos custos energéticos (electricidade, gás e combustíveis utilizados na pesca e na agricultura), ou o caso da redução do Pagamento Especial por Conta.
Apostada em prosseguir este caminho está, pois, a bancada comunista, que anunciou a apresentação para breve de um «programa de desburocratização e apoio às MPME» que estabeleça a «criação de um regime de conta-corrente» entre as MPME e o Estado que alivie a sua tesouraria e que, no caso de serem detentoras de crédito sobre o Estado, seja permitido o acerto das suas obrigações tributárias, entre outras medidas como seja a «actualização do valor previsto no Código das Sociedades Comerciais que sujeita as empresas a revisão legal de contas, assegurando a isenção de revisão legal de contas às pequenas empresas que não sejam sociedades anónimas», ou ainda a adopção de medidas de «acesso ao crédito com juros, prazos e condições adequados à situação da generalidade das MPME e cooperativas».
Outro plano onde a formação comunista estará particularmente focada, dando continuidade aliás ao seu trabalho nesta área, é o da diminuição da factura energética das populações e das empresas, designadamente do gás e da electricidade. Aprovada que foi por proposta sua uma norma no OE de 2017 para medidas de redução do preço do gás de garrafa (o seu custo é praticamente o dobro do do gás natural canalizado), o PCP entende que «é preciso enfrentar com coragem política os interesses dos grupos económicos do sector», pelo que proporá que se «passe à prática» e concretize um «regime de regulação com adopção de preços máximos para o gás butano e propano», como sublinhou aos jornalistas João Oliveira.
Paralelamente, revelou, serão ainda propostas medidas de redução dos custos energéticos, nomeadamente na energia eléctrica e no gás natural, «através da reposição da taxa de IVA em seis por cento através da devolução aos consumidores, por via da redução das tarifas, das verbas indevidamente apropriadas pelas empresas fornecedoras de energia».
Defender e repor direitos
A insistência na necessidade de prosseguir o «caminho de defesa, reposição e conquista de direitos», depois do forte agravamento da exploração dos trabalhadores e de uma «persistente crise social» deixados pela política de direita dos PEC e do pacto de agressão, continuará a marcar a intervenção do PCP. Essa foi uma certeza deixada pelo líder parlamentar comunista, João Oliveira, que anunciou estarem a ser ultimadas várias iniciativas nesta área, uma das quais é a realização no dia 15 de Maio de uma audição pública, com a participação das organizações representativas dos trabalhadores, destinada ao reforço de propostas suas no quadro do combate à desregulação dos horários de trabalho, «prevenindo o abuso e promovendo a protecção dos trabalhadores em regime de turnos, defendendo a redução do horário semanal para as 35 horas».
O combate à desvalorização dos salários através do seu aumento geral e do aumento do SMN para os 600 euros é outra linha que continuará bem presente na intervenção da bancada comunista, que dedicará igual atenção ao combate à precariedade dos vínculos laborais na administração pública, no sector empresarial do Estado e no sector privado.
A reposição dos direitos subtraídos aos trabalhadores da administração pública, nomeadamente nos planos salarial, progressões e carreiras, ocupará também um lugar de destaque na acção dos deputados comunistas, que não desistem igualmente de ver consagrado o direito à reforma sem penalizações aos trabalhadores com 40 ou mais anos de descontos.
Promover a contratação colectiva
A contratação colectiva dará o mote ao agendamento potestativo de que o PCP ainda dispõe nesta sessão legislativa e que agendou para o próximo dia 4 de Maio. Nele estará em debate um projecto de lei onde se propõe a reposição do princípio do tratamento mais favorável do trabalhador e a proibição da caducidade dos contratos colectivos de trabalho por via da sua renovação sucessiva até à sua substituição por outro livremente negociado entre as partes.
Como é dito nas conclusões das Jornadas, tendo presente que os contratos colectivos de trabalho são uma «peça fundamental na vida dos trabalhadores portugueses e são um instrumento indispensável para uma justa distribuição da riqueza», importa que os direitos consagrados na contratação colectiva sejam protegidos e que o Código do Trabalho tenha um «verdadeiro papel na promoção da contratação colectiva».
Criar as regiões administrativas
O PCP quer ver estabelecido um calendário que permita que em 2019 esteja concluída a criação e instituição das regiões administrativas. Uma proposta concreta nesse sentido será formalizada em breve, informou João Oliveira, adiantando que a mesma prevê que a AR, através de resolução, submeta à consulta das assembleias municipais, até ao final de 2017, dois mapas possíveis de criação em concreto das regiões administrativas. Um, refere-se à proposta assente no mapa de criação aprovado em 1998 e submetido a referendo; o outro, corresponde às cinco regiões-plano hoje coincidentes com as áreas das CCDR.
De acordo com o calendário proposto, o resultado do debate nas assembleias municipais (deliberações ou pareceres) será por estas enviado até ao final do primeiro semestre de 2018, após o que, no segundo semestre de 2018, poderia ser aprovada a Lei de Criação das Regiões e a proposta de convocação de um referendo a realizar no primeiro trimestre de 2019.
Em caso afirmativo no referendo, ainda segundo aquele calendário, as primeiras eleições para os órgãos das regiões administrativas poderiam ocorrer no segundo semestre de 2019, passando a coincidir com as demais eleições autárquicas a partir de 2021.
Ciente da importância deste objectivo e de obter uma «ampla convergência que o torne possível», os deputados comunistas aprovaram também nas suas Jornadas a realização de um conjunto de iniciativas de debate a partir da AR sobre esta matéria, bem como o início de contactos com os restantes grupos parlamentares com vista a apurar opiniões sobre a regionalização e a obter os consensos políticos que permitam torná-la realidade.
Tomar o pulso
Do programa das Jornadas constou um diversificado programa de visitas e encontros que permitiu aos deputados comunistas um conhecimento mais aprofundado da realidade no distrito de Coimbra.
Divididos por grupos e acompanhados por responsáveis locais e regionais do Partido, incluindo pelo membro da Comissão Política Vladimiro Vale, os parlamentares do PCP realizaram encontros com representantes de trabalhadores e de empresas, com agricultores, unidades de saúde, instituições do Ensino Superior e Politécnico, estudantes, estabelecimento prisional, movimentos de utentes, associações ambientais.
Dessa mais de dezena e meia de encontros, onde se apurou saber e experiência que a bancada comunista não deixará de incorporar na sua acção futura, daremos conta em próxima edição.