Central para a Festa como o Partido é para o País

António Santos

No co­ração do maior evento po­lí­tico-cul­tural do País, o Es­paço Cen­tral foi a mo­rada das prin­ci­pais ex­po­si­ções e a im­pressão di­gital de uma festa que, re­pe­tindo-se desde 1976, nunca se re­pete. Local de eleição para de­bater, aderir ao PCP ou sim­ples­mente beber um café à sombra do Café d’A­mi­zade, o Es­paço Cen­tral foi a porta de en­trada para o Ci­ne­A­vante!, para a Bi­enal de Artes Plás­ticas e para toda a Festa.

«Qual­quer er­rinho desfaz o texto todo», está dado o alerta. Gesto an­tigo, mi­lhões de vezes re­pe­tido, es­tica-se a tinta no tipo mon­tado, es­tende-se a folha de papel como se se ta­passe uma cri­ança e quando o rolo finda a tra­vessia e mais veloz que a úl­tima im­pres­sora a laser, está im­pressa uma pá­gina do Avante! «Isto é pa­tri­mónio dos tra­ba­lha­dores por­tu­gueses», diz o mi­li­tante co­mu­nista exi­bindo a folha de tinta fresca a bri­lhar ao sol. Quem a re­cebe é um jovem ope­rário da TAP recém-ins­crito no Par­tido. «É uma his­tória glo­riosa, uma his­tória so­frida», ex­plica-lhe Rui Pedro Garcia, «Os ti­pó­grafos que fa­ziam este jornal, que hoje tem a honra de dar o nome à Festa, en­tre­gavam a vida à causa, pas­savam di­fi­cul­dades imensas. Ar­ris­cavam tudo. Al­guns nem à es­cola foram, apren­deram as le­tras a mexer nos tipos, mas ti­nham de ser cri­a­tivos, ima­gi­na­tivos, cultos...» Abra­çada por uma pe­quena mul­tidão, a velha ti­po­grafia clan­des­tina não tem des­canso: tinta, papel, rolo, tinta, papel, rolo, «o grande pro­blema era o som, a re­pe­tição forma uma ca­dência que pode ser ou­vida pelos vi­zi­nhos», de­monstra o ti­pó­grafo, «punha-se a vida em risco para levar aos tra­ba­lha­dores a única in­for­mação que não pas­sava pelo lápis azul da cen­sura. A in­for­mação do Avante!, mais nin­guém a le­vava». «E de certa forma, isso ainda é assim», co­menta o novo mi­li­tante, en­quanto dobra em quatro a folha de jornal para me­lhor caber na car­teira.

Nas pa­redes pró­ximas, vá­rias pri­meiras pá­ginas do Avante!, do pri­meiro nú­mero à pri­meira edição de­pois do 25 de Abril, contam uma his­tória he­róica que ganha con­texto e di­mensão hu­mana na ex­po­sição de­di­cada à vida de Bento Gon­çalves, ímpar mi­li­tante co­mu­nista e Se­cre­tário-geral do PCP as­sas­si­nado pelo fas­cismo no «campo da morte lenta» do Tar­rafal.

 

Voz do povo

Me­rece ainda des­taque a ex­po­sição «Mú­sica | Povo | Luta – Os sons de um povo na co­lecção de Louzã Hen­ri­ques», que trouxe à Festa uma parte da co­lecção do mi­li­tante co­mu­nista Louzã Hen­ri­ques como «ele­mento da luta pela de­mo­cracia cul­tural, em que a cul­tura po­pular é um pro­ta­go­nista cen­tral», podia ler-se. Eram ae­ro­fones, idi­o­fones, cor­do­fones e mem­bra­no­fones, «ins­tru­mentos ar­te­sa­nais de grande be­leza, cada um di­fe­rente do seu se­me­lhante, ao con­trário dos que vêm da fá­brica», va­lo­rizou Ma­nuel Pires da Rocha, que par­ti­ci­pava num de­bate com Luís Fer­reira Louzã Hen­ri­ques.

 A poucos me­tros, no sempre con­cor­rido Fórum de De­bates, os temas em dis­cussão in­di­cavam o Norte do PCP: «em­prego, pro­dução, so­be­rania ‒ li­bertar Por­tugal da sub­missão ao Euro», «pre­ca­ri­e­dade ‒ ins­tru­mento de ex­plo­ração», «cen­te­nário da re­vo­lução de Ou­tubro ‒ so­ci­a­lismo, exi­gência da ac­tu­a­li­dade e do fu­turo», «O Ca­pital de Karl Marx» e «CDU ‒ Tra­balho, ho­nes­ti­dade, com­pe­tência».

Também em grande des­taque nas pa­redes do Es­paço Cen­tral, grandes pai­néis va­lo­ri­zavam a in­ter­venção, o tra­balho e a obra re­a­li­zada pela CDU no poder au­tár­quico como fac­tores in­dis­pen­sá­veis ao pro­gresso e ao de­sen­vol­vi­mento lo­cais e à de­fesa dos in­te­resses das po­pu­la­ções.

 

Ou­tubro é fu­turo

No ano em que se ce­lebra o cen­te­nário da Re­vo­lução de Ou­tubro, o evento maior da his­tória da hu­ma­ni­dade me­receu dos co­mu­nistas por­tu­gueses um lugar de honra. Sob o tí­tulo «Cen­te­nário da Re­vo­lução de Ou­tubro – So­ci­a­lismo, exi­gência da ac­tu­a­li­dade e do fu­turo», a prin­cipal ex­po­sição do Es­paço Cen­tral con­duzia os vi­si­tantes pelos ca­mi­nhos, nunca li­ne­ares, da cons­trução do pri­meiro Es­tado pro­le­tário. As con­sequên­cias da epo­peia so­vié­tica, que fez da Rússia semi-feudal a so­ci­e­dade com mais di­reitos do mundo e que con­quistou o es­paço, surgem pro­jec­tadas no 25 de Abril, na der­rota do nazi-fas­cismo e na pró­pria gé­nese e na­tu­reza e pro­jecto do PCP. De­mons­trada ficou também a cau­sa­li­dade entre a dis­so­lução da URSS e as guerras e de­si­gual­dades que ca­rac­te­rizam os nossos dias.

«A re­vo­lução de Ou­tubro não é um acto iso­lado», frisou Ma­nuel Ro­dri­gues, que con­duziu uma das sete vi­sitas gui­adas, «in­sere-se na luta mi­lenar dos ex­plo­rados e dos opri­midos, que sempre so­nharam, cri­aram uto­pias e se re­vol­taram». Com efeito, a ex­po­sição, su­por­tada por fo­to­gra­fias his­tó­ricas e textos in­for­ma­tivos, mas também por filmes, re­pro­du­ções de obras de arte e di­versos ob­jectos, não se es­go­tava no ano cujo cen­ténio as­si­nala. Como se podia cons­tatar nesta ex­po­sição, cem anos após a Re­vo­lução de Ou­tubro o so­ci­a­lismo afirma-se como exi­gência da ac­tu­a­li­dade e do fu­turo. A Re­vo­lução de Ou­tubro surge sempre li­gada à vida, plena de ac­tu­a­li­dade, ur­gente. «Foi a URSS o pri­meiro país do mundo a pôr em prá­tica ou a de­sen­volver como ne­nhum outro di­reitos so­ciais fun­da­men­tais», podia ler-se, «Di­reito ao tra­balho, proi­bição do tra­balho in­fantil, jor­nada má­xima de oito horas, fé­rias pagas, igual­dade de di­reitos de ho­mens e mu­lheres na fa­mília, na vida pri­vada e no tra­balho, di­reito e pro­tecção na ma­ter­ni­dade, di­reito à ha­bi­tação, as­sis­tência mé­dica gra­tuita, sis­tema de se­gu­rança so­cial uni­versal e gra­tuita, di­reito à livre cri­ação e fruição da cul­tura, des­porto para todos».

 



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