Amor comunista

Carina Castro (Membro da Comissão Política)

Resistir corajosamente, em todas as circunstâncias, é derrotar o egoísmo

O amor ao povo: as mãos dos pescadores, os que cuidam da Touriga nacional e do Alvarinho, os que descobrem asteróides, fazem revoluções, a música e a coragem.

Amor aos trabalhadores, feito consciência de classe e combatividade, aos que criam a riqueza, não um “de nós para eles”, mas apenas um “nós”: por sermos a força que tudo constrói, quem faz acontecer o mundo, porque somos a maioria, por vontade inelutável de transformar exploração em emancipação.

Amor à pátria – um povo e a sua terra, pátria-pão, luz, mar. Desse amor emana a soberania como forma de emancipação nacional colectiva, que irradia para os outros, não é egoísta ou chauvinista, mas liberdade, autodeterminação. Não é só para nós, é para todos os povos.

Por isso mesmo, é amor à paz e aos outros povos, das mais diferentes latitudes, com a solidariedade poderosa dos oprimidos, que não é vencida pelo cinismo, a hipocrisia ou o oportunismo – faz-lhes frente, orgulhosamente.

Amor à razão, ao que é racional, sendo saboreado com toda a emoção. Amor à verdade – nada temos a esconder do que somos e propomos, mesmo que não seja popular – a verdade é uma força. Amor aos princípios.

Amor à justiça, à liberdade e à democracia, o que «implica um elevado conceito acerca do ser humano, do seu valor presente e do seu valor potencial»i, ser um «democrata sem esforço»ii.

Amor ao conhecimento – teórico, concreto –, examinando e aprendendo com a vida e com as ideias. Amor à dialéctica: à análise objectiva dos factos, não confundindo desejos com realidade; à análise de todos os aspectos e não confiando apenas na nossa intuição ou perspectiva; olhar para o contexto histórico dos fenómenos, crítica e criativamente; conhecer as contradições, descobrir origens e forças; passar da quantidade para a qualidade: fazer de milhares de pequenas e grandes lutas a transformação necessária.

Amor ao que é novo e progressista, ao novo porque é o futuro que nos espera. Uma alternativa positiva, que constrói, e por isso transforma ao modo como nos vemos a nós próprios, mas também como nos relacionamos com os outros e com o mundo.

Temos um amor próprio, digno, não egótico, mas porque somos parte de um objectivo comum, para lá dos interesses e do interesse pessoal, da nossa identidade e dos nossos gostos, porque criamos laços de camaradagem – dentro e fora do Partido – rede, confiança, solidariedade, generosidade, disciplina e compromisso, honestidade e lealdade. Isto que não é só sobre cada um de nós, não se fará sem cada um de nós, na sua singularidade. Essa transferência do indivíduo ao colectivo é um acto derradeiro de generosidade, mas também de realização individual.

E por isso o amor comunista é também uma expressão de amor ao outro, mesmo aquele que não conhecemos ou que pensa de forma diferente: lutamos por e com ele, para que seja livre, lutamos para que também ele seja protagonista da História e tenha tudo o que é seu por direito. Às vezes é mesmo muito difícil amar quem pensa de forma diferente, ou vota de forma diferente de nós, mas sabemos que este povo não merece que nenhum mal se abata sobre ele. Resistir corajosamente, em todas as circunstâncias, é derrotar o egoísmo, é a derrota do capitalismo triunfalista: é a forma como nós comunistas, actuamos, vivemos, lutamos, e projectamos afectos em terra de fraternidade.

É uma certa forma de amar o mundo e a Humanidade, amar a memória e história, tanto como amamos o futuro. Amor ao projecto comunista, o nosso projecto de comunistas portugueses.

Paciência e urgência, porque não estamos condenados a apenas sobreviver aos dias, porque amamos a vida, a alegria e o nosso projecto libertador que será realidade, não por desejo ou utopia, mas por certeza histórica sobre as relações sociais, densa de materialidade, pela acção dos homens e das mulheres, aceleremos a história, então, façamos acontecer a sociedade de abundância, «a sociedade de trabalhadores livres e conscientes na qual o trabalho será não apenas uma fonte de riqueza mas uma actividade criadora e uma fonte de alegria, de liberdade e de valorização pessoal e na qual a paz, a saúde, a cultura, o repouso, o recreio, um meio ambiente equilibrado, a acção colectiva e o valor do indivíduo serão componentes da felicidade humana»iii. Amor comunista.

iÁlvaro Cunhal, O Partido com Paredes de Vidro

iiIdem, ibidem

iiiPrograma do Partido Comunista Português, Uma Democracia Avançada – os Valores de Abril no Futuro de Portugal

 



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