Privatização dos transportes «a la carte»
O PCP acusa o Governo de estar a concertar com o patronato do sector dos transportes a forma de privatizar as mais importantes e lucrativas empresas.
O Governo serve plenamente os interesses privados
Num comunicado do organismo de direcção do Sector dos Transportes da Organização Regional de Lisboa, do final de Fevereiro, o PCP acusa o Governo de ter lançado um inquérito aos grupos económicos para estes «lhe dizerem como querem explorar o Metro e a Carris, mas cuja filosofia se estende a todo o sector dos transportes». Particularmente revelador é o facto de esta consulta não se dirigir aos que todos os dias utilizam a rede de transportes, nem aos que aí trabalham e não pretende sequer envolver as autarquias. A sua intenção é apenas e só uma: «o que querem os capitalistas que o Governo faça e como?»
A resposta do grupo Barraqueiro, divulgada na imprensa, é sintomática: este grupo pretende que, para privatizar, o Estado assuma a despesa de infra-estrutura e equipamentos e metade dos restantes custos de exploração. O PCP acusa o Governo de admitir «todos os cenários» quando se trata de satisfazer os interesses dos capitalistas, incluindo o despedimento de todos os trabalhadores das empresas. «O que nunca aparece como preocupação – antes pelo contrário – é o desenvolvimento do serviço público de transportes para que este sirva, cada vez melhor, os utentes, respeite e valorize os seus trabalhadores e dê o importante contributo que lhe cabe à economia», acrescenta o Partido.
No comunicado, o PCP admite que muitas destas questões estejam já negociadas com o patronato e acusa o Governo de pretender, com este inquérito, «montar uma operação para justificar o injustificável: como pagar aos privados o que se recusou às empresas públicas». Apelando aos trabalhadores e aos utentes para que leiam o conteúdo do inquérito (disponível em www.imtt.pt), o Partido aponta o caminho da unidade e da luta em defesa das empresas públicas de transporte. Uma luta que, acrescenta-se, deve unir trabalhadores e utentes, sindicatos e autarquias.
De novo as PPP...
Num anexo ao comunicado, o PCP aprofunda a análise do conteúdo do «Documento de Consulta, Modelo de Abertura à Iniciativa Privada dos Serviços Públicos de Transporte de Passageiros de Lisboa», garantindo que estará em preparação uma nova onda de Parcerias Público Privadas.
Para o PCP, o apregoado objectivo de fazer com que os transportes públicos sejam totalmente financiados pelos utilizadores é «não só errado como é falso». Tal como sucedeu com anteriores PPP, a «poupança para o Estado é só cosmética». Veja-se as hipóteses formuladas para o Metropolitano de Lisboa: «que o concessionário não pague a manutenção, nem da infra-estrutura nem do material circulante; que o concessionário não pague nem o investimento nem a dívida gerada pelo anterior investimento; que o concessionário utilize sem pagar o material circulante.»
Com estas regras, acrescenta o PCP, a actual empresa pública não só podia prescindir das indemnizações compensatórias como passaria a ter um saldo positivo de milhões de euros. O «milagre» da privatização é, afinal, um «truque de magia», acrescenta o PCP: «a despesa fica no Estado, só as receitas vão para o privado.» No documento do PCP denuncia-se ainda a intenção expressa de aumentar o preço dos títulos de transporte.
Os trabalhadores e a dívida
No seu afã de servir os interesses dos grupos económicos privados, o Governo ameaça mesmo, em futuros processos de privatização (para já da Carris e do Metro), com despedimentos colectivos. O PCP resume desta forma a intenção do Governo: «se se portarem bem [os trabalhadores], deixarem de resistir e aceitarem a redução de salários, as empresas podem continuar públicas». Para além de revelar, assim, o seu medo da luta organizada dos trabalhadores, o Governo demonstra também a postura autoritária e chantagista com que «dialoga» com os trabalhadores e suas organizações representativas.
Particularmente chocante, e revelador das suas opções, é o que o Governo pretende fazer com a dívida das empresas em caso de privatização. Sendo a dívida a questão que «verdadeiramente afoga estas empresas» – e não, como é propagandeado, os custos com pessoal – seria legítimo esperar que o Governo procurasse resolver o problema. Nada mais falso. Com a privatização, a dívida das empresas (criada pelas medidas de sucessivos governos) passará para o Estado. Pior: as empresas privadas poderão especular com essa dívida, recebendo do Estado mais do que aquilo que pagam. Assim se governa para os privados. À custa seja do que for.
Um roubo colossal
Em segundo lugar, acrescenta o Partido, foi à custa das reduções da oferta, da qualidade e da segurança do serviço que conseguiu reduzir o emprego, e foi por via do Orçamento do Estado que conseguiu cortar nos salários. «Se pensarmos que a par da redução de
salários se assistiu a um aumento brutal dos impostos, do custo dos serviços essenciais e um aumento do tempo de trabalho, temos a noção da dimensão do roubo que cada trabalhador destas empresas sofreu.» A luta destes trabalhadores não só foi – e é – plenamente justificada como se destina também a defender os interesses dos utentes.