Guantánamo, inato e paradigmático

Carlos Gonçalves

O «campo de de­tenção» criado em 2002 na base USA de Guan­tá­namo, ocu­pada à força em Cuba desde 1903, cons­titui em si mesmo e pelos factos co­nhe­cidos pa­ra­digma da na­tu­reza inata, be­li­cista e fas­ci­zante do im­pe­ri­a­lismo. A forma como é «es­que­cido» pelas redes «so­ciais» e os média do­mi­nantes, com­pa­ra­ti­va­mente à co­ber­tura brutal das guerras NATO, diz muito sobre a li­ber­dade e a «de­mo­cracia de mer­cado».

As re­gras apli­cadas aos cerca de 800 de­tidos de Guan­tá­namo destes 21 anos são as de «presos de guerra», em versão USA – bar­bárie, tor­turas bru­tais, re­cusa total de di­reitos –, como afirmam tantas en­ti­dades dos States, in­ter­na­ci­o­nais e da ONU.

Logo de início, a «ope­ração» Guan­tá­namo de ter­ro­rismo de Es­tado em offshore foi posta a nu – de­zenas de «pri­sões se­cretas» e cen­tros de tor­tura (e as­sas­sínio) da CIA, em África, Ásia e Eu­ropa, cum­pli­ci­dade de ali­ados dos USA na es­pi­o­nagem, rapto, de­tenção ilegal e ili­mi­tada e tor­tura de presos. No es­paço aéreo na­ci­onal pas­saram 700 rap­tados em 56 voos, al­guns com es­cala nas Lages, etc., sempre com apoio do PS, PSD e CDS e seus go­vernos, que re­cu­saram as pro­postas do PCP de inqué­rito ou de in­ter­dição dos voos da CIA no nosso país.

De­sen­ca­deou-se o com­bate para pôr cobro a esta ig­no­mínia, a so­li­da­ri­e­dade, o es­cla­re­ci­mento e a luta avan­çaram, a der­rota de muitas acu­sa­ções ju­ri­di­ca­mente nulas dos tri­bu­nais mi­li­tares de Guan­tá­namo trou­xeram as pro­messas falsas e in­cum­pridas de Obama e Biden do seu en­cer­ra­mento (Trump de­fendeu o «campo de de­tenção» e as tor­turas), e acon­te­ceram cen­tenas de li­ber­ta­ções, re­pa­tri­a­mentos e trans­fe­rên­cias de ex-presos, mais de 80% dos quais ino­centes. Em Julho de 2023 havia em Guan­tá­namo 30 presos.

Em Agosto foi de­cla­rada ilegal a con­fissão sob tor­tura de Al Nashiri, preso em Guan­tá­namo há 16 anos como «autor moral» do ataque em 2000 ao des­troyer Cole, e foi ne­go­ciado um acordo que im­pede que a con­fissão sob tor­tura de Kalid Mohammed, preso há 20 anos, seja fun­da­mento da apli­cação da pena de morte en­quanto pre­su­mível es­tra­tega dos ata­ques ter­ro­ristas do 11 de Se­tembro de 2001.

Resta cada vez menos fu­turo ao campo de con­cen­tração de Guan­tá­namo, mas não é menos ur­gente a luta para que seja er­ra­di­cado, para que nunca mais volte o crime im­pe­ri­a­lista contra a hu­ma­ni­dade.




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