E vão dez

João Frazão

O BCE decidiu, pela décima vez, o aumento das taxas de juro de referência.

Não fomos capazes de apurar se, pelo meio, houve alguma reunião em que os dignitários da instituição que gere a política monetária da União Europeia tenham tomado alguma outra decisão para além de carregar sempre nos mesmos, mas sabemos pela voz da própria presidente que, no futuro próximo, é escusado esperarmos novidades positivas vindas dali.

Pela décima vez, de «vinte e cinco pontos base» em «vinte cinco pontos base», sob o pretexto de combater a inflação, os senhores do Banco Central atacaram a economia, atacaram as famílias, atacaram o direito à habitação e a uma vida digna, atacaram as pequenas e médias empresas, a braços já com os aumentos dos custos de produção e, desde logo, com os combustíveis e a energia.

Pela décima vez, os governantes portugueses esboçam bocejos de enfado, mas de facto fazem vista grossa e deixam passar cada uma destas estocadas.

Pela décima vez, os bancos, e em particular os seus accionistas, esfregam as mãos de contentes sabendo que esses aumentos de juros (que as famílias e os pequenos empresários não sabem se podem pagar) significarão ainda mais lucros, sendo apenas necessário pensarem como vão «acertar» a contabilidade para pagar o mínimo de impostos.

E, à décima vez, Christine Lagarde, a porta-voz deste bando de malfeitores, não satisfeita com os impactos das suas medidas, avisa os países, e ameaça-os do castigo correspondente como se de meninos mal comportados se tratasse, para não se atreverem a aliviá-los. E os governos, porque lhes dá jeito, fingem ser meninos que não têm responsabilidades e atiram as culpas para cerca dos outros.

São dez aumentos. Dez vezes penalizadores. Dez vezes brutais. Dez vezes que cada um paga, com língua de palmo, as consequências concretas da submissão das opções nacionais aos ditames da UE e do BCE.

São dez, dez mil ou dez milhões os que sentem na pele a irracionalidade do capitalismo, até que se levantem e exijam um outro caminho.




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