Os lucros dos grupos económicos não são “notícia”

Vasco Cardoso

Este título não é rigoroso. Com uma simples pesquisa encontramos pequenos apontamentos sobre os lucros das principais empresas a operar no país. É o caso dos lucros da ANA – Aeroportos, empresa controlada pela multinacional francesa Vinci, que no ano passado atingiram um novo recorde de 511 milhões de euros, mais 22,5% dos já históricos lucros alcançados em 2023 (417 milhões de euros), que por sua vez tinham superado os alcançados em 2022 (334 milhões de euros).

Sim, não se pode dizer que não há notícias. Mas estas esgotam-se na subida ou descida dos números, na sopa dos milhões de euros que muitos não conseguem interpretar a escala e o alcance do que representam. Desafia-se, aliás, quem conseguir encontrar mais do que isso. Sobretudo nos múltiplos espaços de comentário político, e até económico, nas dezenas de artigos de opinião, na torrente de indignações que atravessam as redes sociais. E tanto que havia para dizer. Seja sobre o que representam os lucros dos grupos económicos, em geral, seja sobre este caso concreto da ANA. Lucros que em três anos (12 612 milhões de euros) ultrapassam o que a Vinci pagou pela concessão dos aeroportos por um longo período de 50 anos. Lucros que assentam no agravamento das taxas aeroportuárias e da força de trabalho, e na redução significativa do investimento nos aeroportos nacionais. Lucros que saem do País e vão parar, sob a forma de dividendos, aos bolsos dos accionistas da Vinci (“ANA distribuiu 728 milhões de euros em dividendos ao grupo Vinci nos últimos dois anos”, diz o Observador, referindo-se a 2022 e 2023). Lucros de uma empresa que, com o apoio do poder político, tudo fará para manter o velho aeroporto dentro da cidade de Lisboa – com os riscos e impactos associados – e arrastar o mais possível a construção de um novo. Lucros que decorrem de uma privatização que, como o PCP já denunciou em livro, representa um “Assalto aos Aeroportos” que querem continuar por mais umas décadas.

Esta invisibilidade e naturalização destes lucros escandalosos – podíamos falar da banca ou da energia – não é inocente. Ela apaga as gritantes desigualdades e a injustiça na distribuição da riqueza, oculta o confronto de classe entre o trabalho e o capital, branqueia as responsabilidades da política de direita e o crime económico das privatizações e facilitam, na ausência de uma leitura de classe sobre a realidade, todo o tipo de mistificações que conduz as principais vítimas da política de direita a errar o alvo sobre os verdadeiros responsáveis pela sua situação.



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