É o sistema a funcionar
O anúncio feito pelo primeiro-ministro da intenção de garantir, já este ano, a concretização do objectivo de 2% do PIB para despesas militares suscita, pelo menos, três reflexões que é de primordial importância levar às massas.
Em primeiro lugar, acabou-se a lengalenga de que não há dinheiro, de que os recursos são escassos, ou, como dizia Montenegro, de que «não se pode dar tudo a todos».
Os mesmos que, durante anos, negaram os investimentos que são indispensáveis no Hospital Militar, obstaculizaram a valorização do Arsenal do Alfeite, com o que isso significaria de apoio à produção nacional, negaram a melhoria das condições de vida dos militares e impediram a dignificação das próprias Forças Armadas, admitem gastar, já este ano, em poucos meses, centenas de milhões de euros em despesas ordenadas pelos EUA, a UE e a NATO. Quando eles querem, quando isso interessa ao capital, o dinheiro aparece logo às pázadas.
Em segundo lugar, este anúncio só é possível fazer porque eles andaram a preparar as pessoas para esta medida. Num quadro em que milhões de trabalhadores têm as vidas apertadas pelos baixos salários, em que tantos continuam a esperar tempos sem fim por resposta do SNS, por falta de meios, em que outros tantos anseiam por saber se terão direito a uma habitação, porque não há dinheiro para construir as que faltam, em que continua a haver dezenas de escolas onde chove ou faz frio ou calor insuportáveis, exactamente porque o Orçamento não estica, o anúncio de milhares de milhões para a promoção da guerra só é possível de aceitar por amplas camadas populares porque, ao longo de anos, os meios de comunicação, ao serviço do Capital, foram disseminando a teoria do medo face ao inimigo externo, com horas e horas de notícias, comentário e documentário feitos à medida da criação desse ambiente propício. Eles têm os manuais da ofensiva ideológica e aplicam as receitas meticulosamente para atingirem os seus fins.
Por último, este anúncio, e a desfaçatez com que foi feito, só são também possíveis porque a AD sabe que nesse caminho contrário aos valores da Paz inscritos na Constituição, pode contar quer com o apoio cúmplice do PS – cujo quase Secretário-Geral já veio anunciar cinco Pactos de Regime com que quer dar a mão ao Governo, incluindo, lá está, na área da Defesa – quer com o beneplácito do Chega, que o próprio primeiro-ministro meteu ao barulho, indicando-o como parceiro privilegiado, deixando para trás a conversa do “não é não”. É o sistema a funcionar!