Orçamento rectificativo

A confirmação de um desastre anunciado

Com os votos fa­vo­rá­veis da mai­oria PSD/​CDS-PP, e a abs­tenção do PS (res­tantes ban­cadas vo­taram contra), o Par­la­mento aprovou o or­ça­mento rec­ti­fi­ca­tivo do OE para 2012. Para o PCP, este é um do­cu­mento que só «vem con­firmar o ca­minho de de­sastre a que o pacto de agressão está a con­duzir o País».

Po­lí­ticas da troika em­po­brecem o País

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Esse é o as­pecto cen­tral a reter deste ajus­ta­mento às contas do Es­tado, como tratou de su­bli­nhar no de­bate o de­pu­tado co­mu­nista Ho­nório Novo, que con­si­dera terem igual­mente fi­cado à vista as «con­sequên­cias dra­má­ticas da aus­te­ri­dade que é im­posta ao País pela troika».

Con­sequên­cias que enu­merou, ci­tando, entre ou­tras, «a re­cessão que é cada vez mais acen­tuada, a des­truição cres­cente do em­prego, taxas de de­sem­prego as­sus­ta­doras, fa­lên­cias de mi­lhares de pe­quenas em­presas, roubos e corte ina­cei­tá­veis nos sa­lá­rios, nas re­formas e sub­sí­dios, nas pres­ta­ções so­ciais».

Par­ti­cular atenção da ban­cada do PCP me­receu, por outro lado, a afir­mação do mi­nistro das Fi­nanças de que o rec­ti­fi­ca­tivo não tem me­didas adi­ci­o­nais. Ho­nório Novo não he­sitou em clas­si­ficá-la como uma ine­gável «men­tira, mais uma men­tira mesmo que seja dita ao re­tar­dador».

E ex­plicou que o Go­verno com este rec­ti­fi­ca­tivo o que veio anun­ciar foi que os sub­sí­dios de fé­rias e de Natal «só vão ser re­postos em 2015 e mesmo assim de forma gra­dual».

«Esta é a grande men­tira que o se­nhor mi­nistro veio trazer ao Par­la­mento, acusou o par­la­mentar co­mu­nista eleito pelo cír­culo do Porto.

 

Uma mi­ragem

 

Para o PCP, o or­ça­mento rec­ti­fi­ca­tivo con­firma também o que só a ce­gueira do Go­verno não quer ad­mitir, ou seja, que as «pre­vi­sões ini­ciais eram vir­tuais, des­li­gadas da re­a­li­dade, que a exe­cução or­ça­mental é uma mi­ragem».

E por isso Ho­nório Novo ad­vertiu que «os riscos para este or­ça­mento são ainda mai­ores do que os exis­tentes para o or­ça­mento ini­cial». Iden­ti­fi­cando al­guns desses riscos, e de­pois de acusar o de­pu­tado do PSD Mi­guel Fras­quilho de não ter dito uma pa­lavra sobre ne­nhum deles, Ho­nório Novo pre­cisou com rigor que está com­pro­me­tido o cres­ci­mento das ex­por­ta­ções (o único factor para o Go­verno de de­sen­vol­vi­mento da eco­nomia em Por­tugal), que a des­truição de em­prego vai ser bem maior do que o pre­visto pelo Exe­cu­tivo (aliás muito abaixo das pre­vi­sões do Banco de Por­tugal, que fala na des­truição de 170 mil em­pregos só em 2012), que ha­verá uma queda do PIB mais acen­tuada e uma nova con­tracção em 2013, que a margem dis­po­nível é nula e, nessa me­dida, qual­quer desvio mí­nimo co­loca em causa a exe­cução or­ça­mental, bem como o dé­fice de 4,5%, «o que na óp­tica do Go­verno le­vará a novas me­didas de aus­te­ri­dade».

 

Em­po­brecer o País

 

Para o PCP, fica assim vi­sível e de­mons­trado que este rec­ti­fi­ca­tivo mantém o rumo e apro­funda as po­lí­ticas do OE ini­cial, mantém e re­força as con­di­ções de ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores e do povo, con­tinua a cortar e a con­di­ci­onar as pres­ta­ções so­ciais, mantém e re­força as di­fi­cul­dades de acesso das pe­quenas e mé­dias em­presas ao cré­dito, des­preza ou eli­mina o in­ves­ti­mento pú­blico, mantém e re­força os cortes nas fun­ções so­ciais do Es­tado e nos ser­viços pú­blicos.

Mas não se ficam por aqui os traços ne­ga­tivos que marcam a acção go­ver­na­tiva. Como su­bli­nhou Ho­nório Novo, vi­sível é também o re­forço do fi­nan­ci­a­mento da eco­nomia de ca­sino (de que é exemplo o apoio da CGD à OPA da Brisa), avul­tando, por outro lado, a re­cusa em dar uma ex­pli­cação sobre a origem e as in­ci­dên­cias or­ça­men­tais de mais uma amor­ti­zação de em­prés­timos dos «veí­culos do BPN».

Em sín­tese, para o PCP, o rec­ti­fi­ca­tivo li­mita-se a «manter e re­forçar as po­lí­ticas da troika que em­po­brecem o país e pre­tendem des­truir di­reitos in­di­vi­duais e co­lec­tivos du­ra­mente con­quis­tados».


Pa­tranha sem ver­gonha

A do­minar o de­bate deste or­ça­mento rec­ti­fi­ca­tivo es­teve sem dú­vida a al­dra­bice pro­ta­go­ni­zada pelo Go­verno na questão dos sub­sí­dios de fé­rias e de Natal e res­pec­tiva re­po­sição. Foi apa­nhado no redil da sua pró­pria men­tira e, acos­sado, pe­rante a evi­dência dos factos, ficou sem es­ca­pa­tória e en­terrou-se por com­pleto.

Vítor Gaspar foi con­fron­tado, no­me­a­da­mente pelo de­pu­tado co­mu­nista Paulo Sá, com afir­ma­ções que pro­fe­rira em Ou­tubro do ano pas­sado em que ga­rantia que aqueles sub­sí­dios se­riam sus­pensos tem­po­ra­ri­a­mente por dois anos, ou seja 2012 e 2013.

Pe­rante a de­cla­ração feita na vés­pera pelo pri­meiro-mi­nistro de que afinal os sub­sí­dios só se­riam re­postos em 2015, o de­pu­tado Ho­nório Novo per­guntou também ao ti­tular da pasta das Fi­nanças se acaso ainda se lem­brava do que tinha dito em co­missão par­la­mentar ainda no dia an­te­rior.

«O se­nhor mi­nistro veio des­mentir ou con­tra­riar o pri­meiro-mi­nistro? Ou veio dizer que foi en­ga­nado pelo se­nhor pri­meiro-mi­nistro? Ou vem-nos re­cordar que 2015 é ano de elei­ções e que o se­nhor vai par­ti­cipar ac­ti­va­mente em mais uma grande men­tira deste Go­verno?», in­quiriu Ho­nório Novo, já de­pois de Paulo Sá ter acu­sado Vítor Gaspar de estar a «jogar com as pa­la­vras».

Sob o fogo ainda de ou­tras ban­cadas à es­querda (com He­loísa Apo­lónia, do PEV, a dizer que o Go­verno não tem le­gi­ti­mi­dade» para fazer os por­tu­gueses de «tolos»; e Pedro Fi­lipe So­ares, do BE, a afirmar que «não se pode andar a brincar com os por­tu­gueses»), Vítor Gaspar pro­curou no de­curso do de­bate re­bater as acu­sa­ções e in­sistir na ideia de que os cortes de sub­sí­dios são tem­po­rá­rios e vi­goram até ao final do cha­mado pro­grama de as­sis­tência, que ter­mina em 2014. Disse ainda que esta foi a po­sição que o Go­verno «sempre teve», que consta desde o «pri­meiro mo­mento» do re­la­tório do OE para 2012, e que «sempre nesses termos» ele pró­prio se re­fe­rira à si­tu­ação.

De­pois da in­sis­tência dos qua­drantes à es­querda do he­mi­ciclo, pe­rante a re­a­li­dade dos factos, lá ad­mitiu ter ha­vido «um lapso» quando disse em en­tre­vista à RTP que a sus­pensão dos sub­sí­dios ter­mi­naria com o pro­grama, que aca­baria em 2013.

O que levou Ho­nório Novo a ques­ti­onar de novo a ban­cada do Go­verno para in­dagar junto do mi­nistro Mi­guel Relvas e da se­cre­tária de es­tado do Te­souro, Maria Luís Al­bu­querque, se pre­ten­diam também ad­mitir «lapsos», uma vez que também eles se te­riam pro­nun­ciado de idên­tica forma quanto à sus­pensão dos sub­sí­dios por apenas dois anos.

Com «lapso» ou sem ele, com este Go­verno, há so­bre­tudo ra­zões para acre­ditar que esta seja mais uma ar­di­losa e pre­me­di­tada ope­ração para jus­ti­ficar a con­ti­nu­ação de um roubo aos tra­ba­lha­dores e aos re­for­mados.


Não ao roubo dos sa­lá­rios

 

Mais uma vez o pri­meiro-mi­nistro usou da men­tira para en­ganar os por­tu­gueses, acusou o líder do Grupo Par­la­mentar do PCP, numa de­cla­ração na AR, a pro­pó­sito da afir­mação de Passos Co­elho em que re­velou a in­tenção do Go­verno de não repor os sub­sí­dios de Natal e fé­rias, nos sa­lá­rios e re­formas da ad­mi­nis­tração pú­blica, no final de 2013.

Esta re­acção de Ber­nar­dino So­ares teve lugar no dia 4, ainda antes de o tema vir horas de­pois a aquecer o de­bate em ple­nário sobre o or­ça­mento rec­ti­fi­ca­tivo.

Trata-se da «po­lí­tica de roubo dos sa­lá­rios», se­gundo Ber­nar­dino So­ares, que disse ser «ina­cei­tável que se con­tinue a roubar os sa­lá­rios dos tra­ba­lha­dores e as re­formas e pen­sões quando ao mesmo tempo os grandes grupos eco­nó­micos con­ti­nuam a em­bolsar muitos mi­lhões».

Exem­pli­ficou, a este pro­pó­sito, com os 12 mil mi­lhões para a banca, os oito mil mi­lhões do BPN, os mil mi­lhões que este ano serão pagos em par­ce­rias pú­blico-pri­vadas.

Para a ban­cada co­mu­nista, adi­antou, esta po­lí­tica de «roubar aos tra­ba­lha­dores e dar aos grandes grupos eco­nó­micos não pode con­ti­nuar».

E por isso «terá a mais firme opo­sição do PCP», ga­rantiu Ber­nar­dino So­ares.





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